sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

O Carnaval de Veneza.

Roberto Delpiano - O Carnaval de Veneza.

O Carnaval de Veneza, na Itália, é diferente em estilo, ritmo e espírito de qualquer outro carnaval. Já em suas raízes é uma celebração de elite, intelectualizada, embora hedonística. As fantasias e as famosas máscaras venezianas inspiram-se na elegância e bom gosto dos trajes dos séculos XVII e XVIII, ou nas personagens da Commedia Dell´Arte, em que figuram os nossos conhecidos pierrôs, colombinas e polichinelos.

No final do século XI, o Carnaval de Veneza aparecia nas crônicas como festejos que chegavam a durar até seis meses. Por essa época chegou-se até a regulamentar o uso das máscaras, que haviam invadido o cotidiano do povo veneziano. São comuns os relatos de abusos praticados atrás das máscaras durante e depois do carnaval de Veneza: desde a mais ingênua tentativa de sedução até o adultério; de pequenos furtos até homicídios. As autoridades proibiram o uso das máscaras no início do século XVII.

Após quase desaparecer no século XIX, o Carnaval de Veneza vem, desde 1980, sendo revivido e encorajado pelas autoridades. Atrai hoje mais de 100 mil pessoas que, apesar do frio e da ameaça das marés altas que freqüentemente inundam a praça de São Marcos, para ali convergem a fim de admirar o luxo das fantasias e das máscaras.

Em Veneza, nas belas mansões e palácios do Gran Canale, organizam-se também luxuosos bailes, regados a champanhe e animados por ruidosas orquestras. A alta sociedade internacional, afastada do burburinho das ruas, comparece aos salões dos hotéis de luxo, decorados a cada ano com temas retirados das óperas de Verdi. Neles dançam-se valsa, tarantela e até mesmo o samba, cada vez mais popular. O povo, por sua vez, concentrado na Praça São Marcos, se diverte de maneira bem mais desinibida.

Commedia dell'arte - Conhecida também como Comédia de Máscaras, a Commedia Dell´Arte era composta por espetáculos teatrais em prosa, muito populares na Itália e em toda a Europa na segunda metade do século XVI até meados do século XVIII. O espetáculo era baseado no improviso dos atores, que seguiam apenas um esquema elaborado pelo autor para cada cena cômica, trágica ou tragicômica. Grandes atores criavam as ações e os diálogos diante do público. Tornaram-se famosas as figuras de Arlequim, do doutor, do capitão Spaventa, de Pulcinella, Pantalone e Colombina, entre outros, com seus tipos físicos regionais, com seus dialetos e temperamentos especiais, vestimentas e máscaras características.

Carnaval.

Origem do nome e da data do Carnaval

Hoje é quase consensual que a palavra Carnaval originou-se de carne + vale (do latim: caro, carnis = carne; vale = adeus), ou ainda da expressão carne levare ou carnilevamen. As duas expressões têm sentido quase idêntico: suspensão da carne, abstenção de carne.

Assim, o Carnaval anuncia a chegada da Quaresma, período no calendário da Igreja Católica consagrado à penitência e ao jejum. Antigamente, a Igreja recomendava aos católicos que ficassem toda a Quaresma sem comer carne. Hoje esta proibição restringe-se à Sexta-feira Santa.

Por isso, o Carnaval no Brasil acontece sempre em fevereiro ou março, nos dias que antecedem a Quaresma. É uma festa móvel, ou seja, não tem data fixa. O período carnavalesco, em sua amplitude máxima, estende-se do Natal até a Quaresma, mas a verdadeira festa consagrada a Momo se limita geralmente aos três últimos dias do período. Em outros países, a data varia de acordo com tradições locais e nacionais: por exemplo, na França a celebração se limita à terça-feira gorda e à mi-carême (quinta-feira da terceira semana da Quaresma). Na Alemanha, em Colônia, o Carnaval é iniciado às 11 horas e 11 minutos do dia 11 de novembro, enquanto que em Munique a festa é comemorada no dia 6 de janeiro, na festa da Epifania.

As origens mais remotas das comemorações de Carnaval são obscuras, assentando-se provavelmente em festividades primitivas de tipo religioso, em honra ao ressurgimento da natureza, com a volta da primavera. É possível associá-lo às festas de caráter orgíaco, como as bacanais, celebrações a Baco, deus do vinho, na Grécia antiga, ou as saturnais, festas em honra a Saturno, Deus da agricultura, na Roma antiga.

Na Idade Média, há referências a comemorações na França, com vinho e sexo; na Itália, como é o caso de Nápoles, os cortejos costumavam levar um enorme falo pelas ruas da cidade; e, em outros países da Europa, as festas eram embaladas por canções que ironizavam os costumes e os governantes. Batalhas de água, ovos e outras substâncias de odor forte também ajudavam a diversão. Pelas características pagãs do Carnaval, as relações entre as autoridades da Igreja e os carnavalescos nem sempre foram cordiais; o que prevaleceu, porém, foi uma relação de tolerância, por parte da Igreja, em relação à festa popular.


Entrudo, de Debret. Museu Castro Maya/IBPC, RJ. As brincadeiras de rua no carnaval brasileiro vêm desde o período colonial. Essa gravura de Debret registra um menino jogando água e um adulto atirando farinha em uma pessoa.


Os entrudos e os primeiros tempos de folia - Nos tempos da Colônia, nas cidades brasileiras, os entrudos eram batalhas em que os foliões atiravam água e farinha do reino nas pessoas que andavam pelas ruas. As cenas dessa festa popular foram documentadas por Debret em suas aquarelas: criados e escravos carregavam cântaros e latas de água para a folia dos patrões.

Depois, apareceram as laranjinhas-de-cheiro e borrachas com água perfumada. Já no século XVIII, os foliões atiravam de tudo: ovos podres, pós de todos os tipos, tomates estragados. A folia atingia igualmente a senzala e a casa-grande, contando com a participação dos governantes e de seus auxiliares. Câmara Cascudo refere-se, no Dicionário do Folclore Brasileiro, aos episódios em que o sisudo Imperador dom Pedro II acabou dentro de um tanque e o arquiteto Grandjean de Montigny morreu de pleurisia decorrente de um entrudo muito animado.

O carnaval de rua persistiu dessa forma, às vezes com folguedos mais violentos que provocavam proibições oficiais e ataques da imprensa. Atualmente, os ataques com confete, serpentina e bisnagas de água nos bailes de carnaval ou nas ruas das cidades fazem relembrar as antigas batalhas do entrudo.

Os primeiros bailes de Carnaval surgiram por volta de 1840 e eram animados por canções portuguesas, sobretudo as quadrilhas e as chamadas chanças lusitanas. Seguiram-se a polca e os ritmos do carnaval italiano. Em 1870, surgiu uma música tipicamente brasileira, o maxixe. Nesse ano, o povo cantou a primeira música carnavalesca do país: E Viva Zé Pereira. Muitos ritmos animaram os carnavais do passado, predominando o samba, as marchas carnavalescas e o frevo. Entre os grandes compositores de músicas carnavalescas do passado, podem ser citados Chiquinha Gonzaga, Noel Rosa, Ari Barroso, Lamartine Babo e Pixinguinha.


Carnaval no Brasil

Todo ano, no sábado de carnaval, logo pela manhã, o Clube de Máscaras Galo da Madrugada, de Recife, abre oficialmente o Carnaval, a festa mais popular do Brasil. O famoso bloco, tido como a organização carnavalesca que mais mobiliza foliões no planeta, já reuniu mais de 1,5 milhão de pessoas em seu percurso de 3,5 quilômetros pela capital pernambucana. Neste ano, a folia reunirá com certeza um número ainda maior de pessoas.

Os festejos carnavalescos no Brasil acontecem em todo o território nacional, mas guardam diferenças regionais muito marcantes. Atualmente, em cidades como o Rio de Janeiro, Olinda e Recife, em Pernambuco, e Salvador, na Bahia, as festas atraem milhares de turistas de todo o país e do exterior. O prestígio dos carnavais dessas cidades está fundado na presença de manifestações locais de cunho folclórico e de certos fatores típicos que lhes conferem facetas inconfundíveis. Em Pernambuco, tem-se a presença do frevo e do maracatu; na Bahia, nota-se a presença das raízes africanas, com seus afoxés e trios elétricos; no Rio de Janeiro, destaca-se o brilho das escolas de samba, com seus desfiles milionários, no Sambódromo da Marquês de Sapucaí.

Entretanto, até meados do século XIX, o carnaval era semelhante de norte a sul do país. Foi o alegre e brutal entrudo, festa popular trazida pelos portugueses, a primeira manifestação carnavalesca no Brasil Colônia e também no Império. Em algumas localidades, ainda ocorrem manifestações remanescentes do entrudo, com corsos e carreatas pelas ruas, em que os foliões travam verdadeiras batalhas atirando ovos, água e farinha.

Jorge Araújo/Folha Imagem

As escolas de samba no carnaval do Rio de Janeiro são uma atração turística internacional. Na foto, grupo especial da escola de samba Beija-Flor.


Rio de Janeiro - O Carnaval do Rio de Janeiro, talvez o mais conhecido e prestigiado como atração turística no país e no exterior, surgiu das espontâneas e antigas manifestações de alegria da população carioca, que durante séculos brincou o carnaval atirando ovos e água nos amigos ao som de qualquer ritmo, até de valsas. Mas foi a partir de um ritmo, o samba, que o carnaval carioca transformou-se lentamente até chegar ao que é hoje: um grande e suntuoso espetáculo para o público que pode pagar o ingresso na Marquês de Sapucaí.

Os desfiles cariocas eram realizados inicialmente pela população pobre dos morros, berços das primeiras escolas de samba, e só ganharam prestígio a partir de 1950, tornando-se logo produtos vendáveis. Atraíram a atenção de governantes e de homens de negócios, que viram o enorme potencial econômico da alegria popular.

Em 1954, a prefeitura do Rio de Janeiro convidou astros e estrelas de Hollywood para a festa e com isso atraiu para o desfile milhares de turistas. A partir de então, a TV, interessada na transmissão dos desfiles, teve um papel fundamental na modificação das relações entre a sociedade e o samba.

Atualmente, os desfiles pressupõem uma organização que extrapola os limites dos sambistas da escola: os espetáculos mobilizam milhões de dólares para sua realização. Surgiram os chamados carnavalescos, profissionais especializados, que criam e dirigem a montagem dos desfiles de cada escola. Ao mesmo tempo, os lugares de destaque na passarela do samba são ocupados por artistas da TV, pelas chamadas socialites, enfim por pessoas que são facilmente identificadas pelo público presente no Sambódromo ou pelos telespectadores das emissoras de TV.


Die Baducca, Spix e Martius. Biblioteca Municipal Mário de Andrade, SP. A origem do samba está nas danças e ritmos praticados pelos escravos africanos.


O Samba - O samba teve origem nos antigos ritmos trazidos pelos escravos africanos que vieram para o Brasil. Afirma-se que a palavra vem de semba, que significa umbigada em dialeto africano.

No século XIX, esses ritmos sofreram influência da polca, da habanera, do maxixe e do choro. O samba chegou ao Rio de Janeiro com as baianas que foram viver na então capital da República, especialmente no bairro de Cidade Nova. Uma delas, tia Ciata (Hilária Almeida, 1854-1924), reunia músicos e boêmios que varavam a noite em sua casa cantando. Numa dessas reuniões apareceu a idéia da música que se tornaria o primeiro samba, gravado pela primeira vez por Donga (Ernesto dos Santos). A letra desse samba, intitulado Pelo Telefone, fala do jogo na cidade. Sua estrofe mais famosa diz:

O chefe da polícia
pelo telefone
mandou me avisar
que na Carioca tem
uma roleta para se jogar


Na década de 1930, o samba, que era tocado basicamente por violões e cavaquinhos, adotou a percussão dos surdos e cuícas, instrumentos comuns nas batucadas dos morros. Estava nascendo o samba moderno. Dele descendem outros gêneros musicais brasileiros como a bossa nova, imortalizada por Tom Jobim e João Gilberto, e o pagode, samba das rodas de amigos e das festas caseiras.


Orzmud Alves/Folha Imagem

Em Olinda, o carnaval é animado pelo desfile de bonecos gigantes. Na foto, bonecos do grupo de mascarados Galo da Madrugada.

Pernambuco - Em Recife e Olinda, os festejos do Carnaval são dos mais animados e característicos do país, com a multidão pelas ruas exibindo seus passos ao som do frevo, ritmo que se tornou a marca do carnaval pernambucano.

A multidão de passistas fantasiados percorre as ruas de Recife durante dias e noites, em um espetáculo de cores e coreografias livres e improvisadas. Curiosamente, a dança é individual mas torna-se um show coletivo em sua cadência irresistível. Em Olinda, cidade da época colonial declarada patrimônio da humanidade, o carnaval de rua é animado por grupos mascarados tradicionais, como O Homem da Meia-Noite e A Mulher do Meio-Dia.

Claudia Guimarães/Folha Imagem

O frevo é o ritmo mais popular de Pernambuco.

Frevo - Dança de rua e de salão, o frevo é a grande atração do carnaval pernambucano. Trata-se de uma marcha de ritmo sincopado, violento e frenético. Diz-se que, ao som do frevo, a multidão fica a "ferver". Segundo os estudiosos, foi dessa idéia de fervura (pois o povo pronuncia "frevura", "frever", etc.) que se criou o nome frevo.

O frevo teve sua origem no Recife, inspirado na polca-marcha. É uma marcha com divisão em binário e andamento semelhante ao da marchinha carioca, porém mais pesada e barulhenta, e com uma execução vigorosa e estridente de fanfarra. Nele o ritmo é tudo, e requer boa forma física para quem quer dançá-lo corretamente. O grande interesse da dança está em sua coreografia, que não é coletiva, de um grupo, de um bloco ou cordão, mas da multidão inteira, cujos passistas dançam individualmente, improvisando passos. O guarda-chuva colorido é o apetrecho típico que acompanha os dançarinos. Nos grupos de rua, os instrumentos são violões, cavaquinhos, flautas, clarinetes e contrabaixos, entre outros.