sábado, 31 de outubro de 2009

A Antropologia Estrututral.

Fonte : educaterra.terra.com.br/voltaire/index_cultura.htm

Estruturalismo - Lévi-Strauss e a antropologia estrutural.



No campo dos estudos da antropologia e do mito, o trabalho foi levado a diante por Claude Lévi-Strauss, no período imediato à II Guerra Mundial, que divulgou e introduziu os princípios do estruturalismo para uma ampla audiência, alcançando uma influência quase que universal, fazendo com que o seu nome, o de Lévi-Strauss, não só se confundisse com o estruturalismo como se tornasse um sinônimo dele. O estruturalismo virou "moda" intelectual nos anos 60 e 70. Os livros dele ("O Pensamento Selvagem", Tristes Trópicos, Antropologia estrutural, As estruturas elementares do parentesco), tiveram um alcance que transcendeu em muito aos interesses dos especialistas ou curiosos da antropologia Desde aquela época o estruturalismo de Lévi-Strauss tornou-se referência obrigatória na filosofia, na psicologia e na sociologia. De certo modo, ainda que respeitando a indiferença dele pela história ("o etnólogo respeita a história, mas não lhe dá um valor privilegiado", in O Pensamento Selvagem, 1970, pag.292), pode-se entender a antropologia estrutural como um método de tentar entender a história de sociedades que não a têm, como é o caso das sociedades primitivas.


A valorização das narrativas mitológicas



Enquanto a ciência racionalista e positivista do século XIX desprezava a mitologia, a magia , o animismo e os rituais fetichistas em geral, Lévi-Strauss entendeu-as como recursos de uma narrativa da história tribal, como expressões legitimas de manifestações de desejos e projeções ocultas, todas elas merecedoras de serem admitidas no papel de matéria-prima antropológica. Como é o caso do seus estudos sobre o mito (Mythologiques) , cuja narrativa oral corria da esquerda para a direita num eixo diacrônico, num tempo não-reversível, enquanto que a estrutura do mito (por exemplo o que trata do nascimento ou da morte de um herói), sobe e desce num eixo sincrônico, num tempo que é reversível. Se bem que eles, os mitos, nada revelavam sobre a ordem do mundo, serviam muito para entender-se o funcionamento da cultura que o gerou e perpetuou. A mesma coisa aplica-se com o totemismo, poderoso instrumento simbólico do clã para reger o sistema de parentesco, regulando os matrimônios com a intenção de preservar o tabu do incesto (cada totem está associado a um grupo social determinado, a uma tribo ou clã, e todo o sistema de casamentos é estabelecido pelo entrecruzar dos que filiam-se a totens diferentes). O objetivo dele era provar que a estrutura dos mitos era idêntica em qualquer canto da Terra, confirmando assim que a estrutura mental da humanidade é a mesma, independentemente da raça, clima ou religião adotada ou praticada. Contrapondo o mito à história ele separou as sociedade humanas em “ frias” e “quentes”, formando então o seguinte quadro delas:

sábado, 10 de outubro de 2009

O tonel das Danaídes.

A.S.Franchini e Carmen Seganfredo.

Belo, rei do Egito, tinha dois filhos: Egito e Danao. Cada qual teve cinqüenta filhos. O primeiro, cinqüenta rapazes, e o segundo, cinqüenta moças. Ora, os cinqüenta filhos de Egito não se entendiam jamais com as cinqüenta filhas de Danao. Em conseqüência, uma guerra civil estourou, lançando uns contra os outros. Após ferozes combates, os filhos de Egito expulsaram do país Danao e suas cinqüenta filhas, obrigando-os a procurar refúgio no reino vizinho de Argos. Felizmente, o rei de Argos, Celanor, recebeu os exilados com toda a generosidade, dando-lhes casa, comida e proteção.
Em reconhecimento, Danao e suas cinqüenta filhas expulsaram-no do trono.
A conspiração começou com um ataque promovido por um lobo contra o rebanho do rei Celanor. A fera, confiante em sua força, abatera o touro que chefiava o rebanho, tomando conta do restante dos animais. Vendo nisto um pretexto. Danao decidiu comprar os vaticínios de um sacerdote influente para que convencesse a corte inteira de que isto era o sinal evidente de uma profecia divina. O sacerdote, diante do povo, explicou então o significado profético do fato:
— O sentido deste acontecimento é evidente e irrefutável — disse. — Significa que uma nova autoridade está prestes a assumir o comando do nosso reino.
— Ai daqueles que se recusarem a se submeter a esta autoridade! — disse Danao, que por conta própria já se proclamara o novo rei.
O povo, assustado, reconheceu imediatamente o novo rei, enforcando em seguida o anterior, numa emocionante cerimônia em praça pública. No reino vizinho, entretanto, a notícia chegara ligeiro.
— Poderoso rei Egito! — disse o mensageiro, que trazia a notícia. — Seu irmão, Danao, agora é o novo rei de Argos!
Temendo que isso pudesse lhe trazer complicações futuras, Egito resolveu prevenir-se, chamando os seus cinqüenta filhos:
— Rapazes, quero que vocês se casem o mais rápido possível com as filhas de Danao! — disse o rei, sem admitir recusas. — Danao agora é rei de um país mais rico e poderoso do que o nosso e precisamos fazer esta aliança com ele.
Egito, na verdade, tinha razão em tentar comprar a amizade de seu irmão. Danao só esperava uma ocasião para pôr em prática a sua vingança. Alguns dias depois, um mensageiro de Egito chegou à corte de Danao, trazendo os cinqüenta convites de casamento. O rei, após dispensá-lo, chamou as suas filhas.
— Minhas adoráveis filhas! — disse -, quero que vocês aceitem o pedido de casamento dos cinqüenta filhos de Egito.
— O quê? Como poderíamos aceitar, se nos traíram de modo tão vil? -exclamaram as cinqüenta moças, indignadas.
— Calma, minhas filhas! — disse Danao, tentando explicar-se. — Depois da cerimônia nupcial, vocês terão o prazer de vingar-se deles todos, matando-os durante a sua primeira noite de amor — completou, com um sorriso.
— Ah, bom... — disseram, aliviadas.
O dia das núpcias chegou. Uma grande festa parou o reino inteiro. Durante a manhã, as cinqüenta filhas de Danao receberam como maridos os cinqüenta filhos de Egito. Um banquete faraônico deu prosseguimento às festividades, até que a noite caiu.
— Agora é preciso que os casais partam para os deliciosos jogos de Vênus! — decretou o rei de Argos, dando a bênção aos recém-casados.
Os casais instalaram-se às margens do belo lago de Lerne, em alvas e espaçosas barracas. De tal forma estava o local protegido da curiosidade do povo, que apenas as estrelas teriam o privilégio de escutar as conversas dos amantes. Dentro de cada ampla barraca, cada uma das filhas de Danao já se despia, revelando aos olhos do respectivo marido as suas formas perfeitas. Sob os travesseiros, porém, repousavam cinqüenta afiados punhais de prata.
Embriagados pela visão de suas cinturas finas e aveludadas, os esposos também começaram a se despir. Antes, porém, que pudessem acalmar o fogo de seus desejos, foram todos apunhalados pelas mulheres, sem dó nem piedade. O sangue espirrou por tudo, respingando até nas estrelas, ornando algumas delas de um halo vermelho.
Depois de consumado o crime, as filhas de Danao arrancaram as cabeças dos maridos, lançando os corpos nas águas do lago, que se tingiu inteiro de vermelho.
Uma delas, no entanto, recusara-se a assassinar o homem com quem recém casara.
— Meu adorado! Amo você e por isto me vejo obrigada a desobedecer a meu próprio pai — exclamou, jogando longe a adaga e caindo nos braços do esposo.
Era Hipermnestra, a única que fez correr naquela noite o seu sangue virginal.
No dia seguinte, todas as filhas de Danao, menos Hipermnestra, apresentaram-se diante do rei empunhando as cabeças de seus cônjuges. Ele exultou ao ver concretizada, finalmente, a sua vingança. Porém, revoltado com Hipermnestra. que faltara com sua palavra, atirou-a num calabouço. Já o marido dela, Linceu. fugiu às pressas para o país vizinho.
No entanto, as danaides, como eram chamadas as filhas de Danao, ficaram outra vez sem maridos.
"Precisamos dar um jeito nisso", pensou o pai das quarenta e nove virgens. Para tanto, decidiu organizar um grande torneio, no qual os vencedores receberiam as mãos de suas filhas em casamento.
— Uma corrida de quadrigas! — sugeriu Danao às moças.
— Oba! — exultaram elas, felizes na expectativa de terem uma nova distração. Na verdade, desde a divertida noite dos punhais as coisas andavam meio aborrecidas na corte.
No dia das corridas, apresentaram-se à corte centenas de concorrentes. As danaides podiam estar certas, ao menos, de arrumar quarenta e nove esposos valentes e destemidos; afinal, não era qualquer um que se dispunha a morrer num acidente de quadriga ou a ser apunhalado na própria noite de núpcias.
Os carros já estavam dispostos na linha de partida. Num balcão, acomodavam-se o rei e suas quarenta e nove virgens. Os competidores, em cima das quadrigas, tentavam conter os cavalos, que escarvavam o chão, ansiosos para lançarem-se na pista. As danaides percorriam com olhos ávidos os corpos nus de seus pretendentes — que estavam livres das vestes, para facilitar a escolha das exigentes mulheres. Foi dada a partida. Uma onda de pó levantou-se à saída dos competidores. Os de trás, sem nada enxergar, logo se embolaram, virando seus carros num amontoado de cavalos, quadrigas e cabeças partidas. Um urro de prazer partiu das arquibancadas, tomadas pela plebe. A pista, no entanto, era grande e circular; assim, enquanto os competidores restantes faziam a volta, os mortos eram recolhidos e lançados num monturo.
— Eia, cavalos! — berravam os dianteiros, que, emparelhados, distribuíam chicotadas no dorso dos cavalos e na cara dos adversários.
Os braços rijos e suados dos homens seguravam com firmeza as rédeas. Do alto da cabeça descia-lhes um suor, que o vento secava rapidamente, mas que se renovava a cada novo esforço que faziam. Os olhos das danaides faiscavam. Seus noventa e oito cotovelos cutucavam-se o tempo todo, a cada novo ângulo de observação que tinham dos corpos dos competidores.
— Aquele lá é meu! — exclamou uma delas, escolhendo o líder da corrida, que tinha os membros lustrosos do óleo que passara por todo o corpo, antes da disputa.
Infelizmente para ela, o carro de seu eleito tombou numa curva, bem em frente à tribuna, lançando-o ao chão como um marionete de madeira. Um grito de horror partiu das virgens, enquanto o corpo do rapaz rodopiava velozmente pelo chão, parecendo um deus hindu de duzentos braços e duzentas pernas. Em seguida, o carro que vinha atrás passou sobre o concorrente, esmagando-lhe a cabeça.
A corrida chegava ao seu final. Os quarenta e nove primeiros competidores cruzaram a linha de chegada, sob a ovação das moças e da ralé ajuntada nas arquibancadas. Cobertos de pó, os pretendentes subiram os degraus da tribuna, indo ajoelhar-se diante das suas futuras esposas. Depois de limpar com seus lenços o suor e o pó dos corpos dos vitoriosos, as danaides depositaram sobre suas frontes douradas coroas de louro.
Enquanto isso, no reino vizinho, Linceu, o marido de Hipermnestra, reunira-se às forças de Egito e invadira o país de Danao. O caos instalou-se.
Danao foi preso e morto. Hipermnestra, a danaide virtuosa, foi libertada de sua prisão pelo esposo. O sangue correu pelas ruas da capital, até que Linceu, o vencedor daquela noite fatídica, transformado em novo rei do país, viu chegada, enfim, a hora de vingar a morte de seus quarenta e nove irmãos. Dirigiu-se com seus soldados até o palácio e ainda chegou a tempo de capturar as virgens, enlouquecidas de medo. Todas as perversas danaides foram, então, passadas a fio de espada, sem piedade. No mesmo dia, suas almas entraram no Hades sombrio; lá as aguardava, impaciente, Minos, um dos juízes do inferno, que lhes decretou uma punição coletiva.
Carregadas de ferros, foram conduzidas até a beira de um imenso lago. Cada qual, portando um pesado jarro de chumbo, foi obrigada a enchê-lo de água até as bordas e levá-lo até a beira de um gigantesco tonel, despejando ali o conteúdo. E assim deveriam repetir a tarefa para todo sempre, até encher o imenso tonel — que não tem fundo.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Achado fóssil mais antigo de criança.

Autor: Cristina Amorim
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/09/2006, Vida&, p. A26

Uma menina de 3 anos dá o que falar na paleontologia. Selam, que significa paz em diversos dialetos etíopes, é a mais antiga criança já encontrada: viveu há 3,3 milhões de anos e é representante da mesma espécie de Lucy, fóssil achado em 1973 com características mistas de chimpanzé e homem.

O novo exemplar de Australopithecus afarensis, que viveu na África entre 3 e 4 milhões de anos atrás, andava ereta, mas aparentemente podia se locomover pelas árvores.

Selam é pelo menos 100 mil anos mais velha do que Lucy e ajudará antropólogos de todo o mundo a compreender melhor como a evolução atuou desde a separação entre hominídeos e chimpanzés.

'É o achado de uma vida', diz o bioantropólogo etíope Zeresenay Alemseged, do Instituto Max Plank de Antropologia Evolucionária, na Alemanha. 'Esta criança vai nos ajudar a entender muita coisa sobre a espécie a que pertence.'

Os fósseis foram encontrados na Etiópia em 2000 e limpos por cinco anos - os cientistas tiraram grão por grão do material e ainda não acabaram o trabalho. A primeira descrição dos fósseis aparece hoje na revista Nature (www.nature.com).

RENASCIMENTO

O azar de Selam significou a sorte de Zeresenay. O motivo de sua morte prematura não está claro ainda, mas possivelmente uma enxurrada a escondeu sob a lama, protegendo o corpo de animais que comem carniça e das mudanças climáticas. Foi assim que boa parte do esqueleto foi preservado, e em sua posição original.

Ele inclui o crânio completo, inclusive uma impressão do cérebro em arenito, mandíbula com dentes, todas as vértebras do pescoço até a parte baixa do tronco, todas as costelas, as escápulas e as clavículas, o cotovelo direito e parte de uma mão, os joelhos e boa parte das tíbias e dos fêmures. Os cientistas também encontraram um pé quase inteiro (que ainda passa pelo processo minucioso de limpeza), que guarda detalhes de como se locomovia.

A metade inferior do corpo tem sinais claros de bipedalismo, ou seja, a locomoção em dois pés, usada até hoje pelos humanos. Existem poucas dúvidas sobre esta habilidade do A. afarensis.

A metade superior, por outro lado, carrega características muito parecidas com as dos primos chimpanzés, como um pescoço curto e grosso (o pescoço alongado dos humanos serve para deixar a cabeça estável numa corrida) e o estribo, pequeno osso dentro da orelha que fornece equilíbrio ao corpo, bem parecido com o dos chimpanzés. Selam também tinha braços longos, estendidos até os joelhos, e dedos curvos.

Todos esses fatores indicam para um caminho pelas árvores, além do solo. Mas podem também ser resquícios da evolução, sinais de um passado não muito distante, mas sem muito uso. Como dentes do siso no homem moderno.

A resposta pode estar no pé: um dedão grande, que auxilia chimpanzés na escalada, seria determinante. 'O espécime pode ajudar a explicar se o Australopithecus afarensis era mais parecido com chimpanzés ou com humanos em diversas maneiras. Então pode esclarecer uma parte da origem das adaptações humanas', diz o paleontólogo e co-autor do estudo René Bobe, da Universidade da Geórgia, nos Estados Unidos.

Os cientistas também acharam em Selam o segundo osso hióide, que liga os músculos da língua, encontrado em ancestrais do homem. Como é muito parecido com o dos chimpanzés, o som seria 'muito mais atrativo para uma mãe chimpanzé do que para uma mãe humana', diz o co-autor Fred Spoor, da University College London.

Determinar a idade que Selam tinha quando morreu já valeria a descoberta: como é o esqueleto mais jovem de um hominídeo já encontrado, ele fornece detalhes únicos sobre o crescimento e a formação dos primatas.

O Paleontólogo.

Um paleontólogo é um cientista que estuda Paleontologia, e deve possuir conhecimentos em Geologia e Biologia que estuda os fósseis para investigar como eram os organismos e os ecossistemas do passado geológico da Terra. O paleontólogo estuda os fósseis, também, para perceber como estes se formaram e como podem ser usados para a datação relativa dos estratos rochosos em que ocorrem. Para investigar a vida do passado da Terra e estudar os fósseis necessário conhecer bem a geologia dos locais onde estes ocorrem e a biologia dos organismos que lhes deram origem.

Diferente do arqueólogo, que estuda as evidências culturais do passado dos seres humanos, o paleontólogo estuda a vida do passado do planeta Terra, incluindo os fósseis de humanos, mas de um ponto de vista paleobiológico. Apesar de, no que toca à escavação de fósseis de vertebrados, a prática paleontológica se assemelhar a uma escavação arqueológica, a arqueologia utiliza métodos de escavação e de estudo diferentes e usa, por vezes, técnicas de datação distintas.

O fascínio pelos dinossauros trouxe um glamour especial à profissão de paleontólogo, mas isso está longe da realidade. Somente quem passou dias a fio sob sol escaldante, com uma picareta nas mãos, trabalhando arduamente, sabe o quanto é difícil trazer à luz do dia o conhecimento enterrado nos estratos geológicos e quantos calos isso faz. Depois são meses de trabalho de laboratório e de gabinete, preparando, montando e estudando todos os fósseis recolhidos, para no final produzir um documento conclusivo, um relatório ou um artigo científico, que deverá em seguida ser publicado e divulgado entre a comunidade científica e o público em geral. Mas, apesar do trabalho duro do paleontólogo, a sensação de encontrar um dinossauro e contar a sua história, é algo que o dinheiro não paga e não há como descrever esta sensação em um pedaço de papel.

A metodologia de trabalho do paleontólogo varia consoante o tipo de fósseis que pretende estudar (fósseis de plantas ou de animais, de animais vertebrados ou de invertebrados,somatofósseis ou icnofósseis), mas é sempre um trabalho rigoso e meticuloso, pautado por critérios científicos bem definidos, com o objetivo último de recuperar o máximo de informação possível sobre os organismos que povoaram o Planeta no passado geológico. Apesar de a metodologia de trabalho do paleontólogo variar de caso para caso, pode estruturar-se este trabalho em algumas etapas básicas:

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Netuno, Senhor dos Mares.

A. S. Franchini e Carmen Seganfredo.

Netuno, após ter sido engolido por seu pai, Saturno, a exemplo de seus irmãos, foi um dia regurgitado, depois que Júpiter obrigou o velho deus a ingerir uma beberagem mágica.
— Pronto, meu irmão — lhe disse Júpiter, satisfeito, depois de ambos haverem derrotado Saturno e seu poderoso exército na famosa Guerra dos Titãs. -Agora já pode tomar posse do mar, que é a parte do Universo que cabe a você. A mim caberão os céus, enquanto que nosso irmão Plutão reinará nos subterrâneos.
Netuno, todo sorrisos, abraçou o irmão. Mas embora todo o imenso território que lhe coube, não foi isto o bastante para contentá-lo. De fato, Netuno era um deus ambicioso, invejoso e intratável, e desde aquele dia entrou em inúmeras disputas com as mais diversas divindades: contra Minerva, disputou a Ática; contra Juno, o domínio da Argólida; contra Apólo, pelo controle do arquipélago de Delfos; e contra o próprio Júpiter, numa tentativa abortada de destroná-lo, ousadia que lhe custou o castigo de ter de servir o rei Laomedonte e construir para ele, pedra por pedra, as muralhas da cidadela de Tróia.
— Só entro em fria, mesmo! — dizia ele, enquanto carregava as imensas pedras. — E além de tudo ainda tenho de agüentar este tagarela dedilhando a lira o dia inteiro. — Netuno referia-se ao deus Apólo, que também estava ali de castigo por uma falta cometida contra Júpiter.
— Sou um astro — disse o acalorado deus do sol, ajeitando-se numa sombrinha para melhor exercer o seu delicado ofício. — Nasci só para brilhar.
Netuno, para piorar, ainda teve o dissabor de ver-se logrado por Laomedonte, que recusou-se a lhe pagar o serviço.
E assim seguia sua vida, de deus rabugento e colérico, sempre fincando seu tridente no fundo do mar e provocando terremotos a propósito de qualquer contrariedade, a ponto de acabar conhecido como "Netuno, abalador da terra".
— "Netuno, o importuno", eis o que é! — disse um dia Júpiter, perdendo de vez a paciência. — É, não tem jeito mesmo, vamos ter de lhe arrumar uma mulher...
Depois de muito pesquisar, o pai dos deuses chegou à conclusão de que a solução estava nas mãos de Nereu, "o velho do mar". Este deus decrépito era filho da velhíssima Terra e do antiqüíssimo Mar, e tinha uma penca de filhas, as Nereidas, assim chamadas em sua homenagem.
— Mercúrio! — disse Júpiter.
— Sim, meu pai — disse o deus dos pés ligeiros.
— Vá até o fundo do mar e me traga o velho Nereu.
No mesmo instante, Mercúrio, que era extremamente rápido em tudo que fazia, calçou suas sandálias aladas e rumou para o oceano. Dando um mergulho espetacular, chegou até os domínios de Nereu.
Mais tarde, no Olimpo, Júpiter exclamou, ao ver a visita:
— Nereu, velho amigo, que bom vê-lo aqui no Olimpo outra vez!
— O que ordena, deus supremo? — disse Nereu de longas e alvas barbas.
— Quero que ceda uma de suas filhas a meu irascível irmão — disse Júpiter, pondo uma mão sobre o ombro do velho amigo. — Não posso mais suportar as suas teimosias e temo que haja um confronto mais sério entre nós, caso ele não se acalme.
— Pois não, Júpiter poderoso — disse Nereu. — Pode escolher qualquer uma de minhas cinqüenta filhas.
— Cinqüenta? — exclamou Júpiter, puxando o lóbulo da divina orelha. -Mas não eram cem?
— Podem ser cem, como podem ser mil, deus supremo — disse o pobre Nereu, cuja memória já claudicava há muito tempo.
Depois de estudar a questão e analisar uma por uma as Nereidas, chegaram, enfim, a um consenso:
— Anfitrite será a esposa de Netuno! — disse Júpiter, jubiloso.
— Anfi-quem? — disse o pobre Nereu.
— Esqueça — disse Júpiter, dando uma palmadinha na face enrugada do amigo.
No mesmo dia Júpiter comunicou a escolha ao mal-humorado irmão, que decidiu, ainda assim, conhecer a sua futura noiva.
— Vá com calma — disse Júpiter. — As filhas de Nereu costumam ter o senso de independência muito pronunciado.
Mas Netuno, que tinha o senso de prepotência ainda mais pronunciado, não se intimidou.
— Onde posso ir encontrá-la? — disse, já se ajeitando.
— Ela está na ilha de Naxos, junto com suas irmãs — disse Júpiter. Netuno, confiante, partiu de seu palácio azulado no fundo do mar em direção a Naxos, conduzindo seu carro puxado por golfinhos.
Fazia um lindo dia de sol quando chegou às margens pedregosas da ilha. De fato, por cima dos grandes rochedos franjados pelas espumas do mar, lá estavam as encantadoras filhas de Nereu, algumas deitadas, descansando, enquanto outras, mais animadas, executavam os passos de uma movimentada dança. De vez em quando uma delas, estirando sua longa cauda recoberta de escamas douradas, dava um mergulho repentino nas águas verdes do arquipélago: um grande borrifo verde erguia-se, então, como se elas lançassem lá do fundo um imenso punhado de esmeraldas, que subiam, faiscando, em todas as direções.
Netuno, boquiaberto, pasmava para aquela cena paradisíaca.
— Verdadeiramente encantadoras... — exclamou o excitado deus, tratando, em seguida, de sentar-se ligeiro em seu carro.
De repente, escutou a voz de uma das Nereidas.
— Ei, Anfitrite! Venha juntar-se a nós, sua boba!
Os olhos de Netuno voltaram-se para uma grande pedra isolada, que estava situada mais para dentro do mar. A pedra tinha o formato de um leito, magnífico trabalho de polimento operado pelas perfeccionistas Ondas, que durante séculos, com toda a calma, a haviam polido até dar-lhe aquela conformação ideal.
Em cima daquele leito solitário e da cor do chumbo estava estendida a divina Anfitrite. Era uma das poucas Nereidas a ter os cabelos negríssimos, da cor da noite, enquanto que as escamas de sua longa cauda tinham uma brilhante cor prateada, matizada por maravilhosos reflexos azulados e cor-de-rosa que se alternavam ao menor movimento. Com as costas coladas à pedra, Anfitrite dos cabelos negros tinha a face voltada para o alto; seu braço direito, caído sobre o rosto, protegia seus olhos dos raios fortes do sol, enquanto os peitos firmes apontavam para o céu.
Netuno empinou seu carro na direção da Nereida de esbelto corpo. Emparelhando com a rocha, Netuno esteve longo tempo a observar os traços de Anfitrite, para ver se podia confiar em suas virtudes. Mas a ninfa adorável permanecia com o rosto quase completamente oculto pelo braço. O deus dos mares, na verdade, só podia observar direito o nariz perfeitamente aquilino de Anfitrite e sua boca úmida e carnuda, maravilhosamente desenhada para o beijo.
"Que mulher!", pensou Netuno, quase apaixonado. "Se tais são seus lábios e seu nariz... oh, como não haverão de ser seus divinos olhos!"
Um arfar mais indiscreto do deus, contudo, despertou a atenção da formosa Anfitrite. Seu braço caiu e as pestanas de longos cílios recurvos ergueram-se, piscantes — e foi, então, como se duas estrelas houvessem se descortinado. -Divina e encantadora Anfitrite! — disse a voz rouca ao seu lado. — A partir de hoje será minha divina esposa e a você caberá a honra de ser, para sempre, o repositório sagrado de meu divino sêmen.
Anfitrite, assustada, ao enxergar a seu lado aquele homem espadaúdo, de longos cabelos recobertos de mariscos e uma barba hirsuta tostada pelo sol a lhe dizer tais disparates, deu um ágil mergulho para dentro da água. Netuno ainda conseguiu agarrar um pedaço de sua cauda, mas as escamas lisas escorregaram por entre seus dedos, até surgir a grande e quase transparente barbatana, leve e fremente como um leque, que lhe deu uma bofetada, antes de desaparecer nas ondas.
— Para onde foi... ? — bradou o deus, desesperado.
E desde aquele dia Netuno perdeu Anfitrite de vista. Percorreu todos os mares, foi mil vezes ao palácio de Nereu, nas profundezas do mar, mas ninguém sabia dizer onde ela estava.
Irado, Netuno começou a sapatear e a bater ferozmente com seu tridente por toda parte, demolindo os imensos rochedos subterrâneos e provocando, com isso, terríveis maremotos na superfície dos oceanos. Ondas imensas eram cuspidas para o alto e montanhas inteiras arremessadas para as costas das cidades marítimas, levando o pânico a todos os mortais.
Finalmente, Júpiter, no último limite da aflição, ordenou a Nereu que revelasse o local onde a apavorada Anfitrite fora se ocultar. O pobre velho não sabia, mas sua esposa Dóris, como toda boa mãe, sabia — e muito bem.
Depois de um sem-número de pedidos, Júpiter finalmente conseguiu obter da mãe das nereidas o que os rogos e súplicas do velho marido, é claro, não tinham podido alcançar.
— Somente as carícias de sua divina filha poderão suavizar o rude temperamento de meu irmão — disse Júpiter à ainda reticente Dóris. — Quando isto acontecer, e a crosta primitiva de meu irmão houver caído, verá ela que se casou com um homem gentil e atencioso, além, é claro, de ter se tornado rainha de todo um império.
— Rainha de todo um império... — resmungou várias vezes a mãe de Anfitrite, até que finalmente cedeu, embora fizesse questão de afirmar que não fazia o menor caso de vir a se tornar mãe da "rainha de todo um império".
Revelado o esconderijo da filha de Nereu, o impaciente Netuno rumou para lá, silenciosamente, montado em seu discreto golfinho. Dentro de uma caverna, oculta por uma floresta de líquens, estava a assustada Nereida, quando Netuno, pé ante pé, adentrou o recinto.
— Anfitrite adorada! — disse ele, cujas barbas estavam lustrosas do aromático âmbar. — Venha comigo e garanto que não terá jamais motivos para se queixar de mim.
Netuno parecia realmente mudado: trajado modestamente, sem aquele ar arrogante que o caracterizava, havia deixado em casa até o seu horroroso tridente. Anfitrite, cautelosa, estudou ainda, longamente, o aspecto do deus. Depois, ainda indecisa sobre se deveria ou não aceitar aquela proposta, perguntou, amuada:
— E quanto àquele negócio de "meu repositório de sêmen"?
— Oh, não, esqueça esta bobagem! — disse Netuno, baixando os olhos. -Você será, para sempre, apenas o repositório de minha divina devoção e meu divino carinho.
Ainda mais corado por aquele sorriso de superioridade da divina Nereida, Netuno enterrou as unhas nas palmas das mãos e resolveu voltar ao velho estilo.
— Venha, vamos de uma vez, minha rainha! — disse, encurralando-a na parede da gruta úmida e dando-lhe um beijo intenso e apaixonado.
Depois levou-a nos braços até o golfinho e retornaram para o palácio de Netuno, onde ambos, desde então, governam felizes o imenso império dos mares.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Lemúria , o mito do paraíso perdido.

Brasil Escola » Mitologia » Lemúria: O mito do paraíso perdido.

Lemúria é um dos continentes extintos, considerados por muitos como o paraíso perdido, igualmente existe Atlântida, outro continente perdido. Até hoje, historiadores, antropólogos, geólogos, biólogos entre outros estudantes e cientistas, fazem especulações se realmente existiu a terra desaparecida. Assim, Lemúria virou muito mais que um mito, uma possibilidade teórica sobre hipóteses do segredo da formação das civilizações no mundo. A noção de Lemúria surgiu primeiro aos cientistas da metade do século 19, quando o grande entusiasmo pelos novos métodos de classificação e análise biológica apareceu para revelar algumas coincidências estranhas.

A palavra Lemúria foi tirada do termo lêmure, e se refere aos que têm habitat limitado com a África, Sul da Índia e Malásia; animais pré-históricos que na Idade Eocena provavelmente habitaram todo o Hemisfério Norte. Assim, a área que Lemúria deve ter ocupado entende-se o arquipélago malásio, através da costa Sul da África até Madagascar.

Alguns acreditam que Lemúria poderia ter sido "o berço da raça humana". Essa especulação ajusta-se às teorias contemporâneas sobre como a humanidade se espalhou por todo o mundo, numa série de migrações. A partir dessa teoria, criou-se o mito que Lemúria poderia ter sido o Éden, o Paraíso perdido, onde a humanidade surgiu.

Por Letícia de Castro
Colunista Brasil Escola

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Maias continuam a surpreenderem arqueólogos.

Autor: John Noble Wilford
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/05/2006, Vida&, p. A34

Descobertas recentes na Guatemala revelam escrita e simbologia sofisticadas mil anos antes da época clássica

Nos muros sagrados e no interior das galerias escuras de ruínas antigas na Guatemala, arqueólogos estão fazendo descobertas que lançam luz sobre a vibrante civilização maia em seu período de formação, abrangendo mais de mil anos antes da celebrada época clássica.

As intrigantes descobertas, que incluem obras-primas artísticas e o mais antigo escrito maia conhecido, derrubam velhas idéias sobre o período pré-clássico. Ele não foi, como se pensava, uma espécie de idade das trevas de uma cultura que floresceu nos tempos clássicos, em lugares como a espetacular ruína imperial de Palenque (México), começando por volta de 250 d.C. e entrando em colapso misteriosamente por volta de 900 d.C.

No negligenciado centro cerimonial de pirâmides e praças espaçosas, uma localidade remota no nordeste da Guatemala conhecida como San Bartolo, arqueólogos descobriram restos inesperados de murais em cores vivas retratando a mitologia maia da criação e da realeza.

Os murais datam de 100 a.C. Uma coluna de hieróglifos próxima, um ou dois séculos mais antiga, atesta um sistema de escrita já bastante desenvolvido.

CONTINUIDADE

As descobertas, anunciadas ao longo dos últimos seis meses por uma equipe americana-guatemalteca liderada por William A. Saturno, da Universidade de New Hampshire, empolgam a pequena comunidade dos estudiosos da civilização maia.

Eles vêem essas descobertas como fortes evidências da origem antiga e da notável continuidade dos conceitos de cosmologia e governança da cultura maia ao longo de mais de um milênio antes da era clássica.

Depois de uma visita a San Bartolo, Michael D. Coe, estudioso dos maias da Universidade Yale, qualificou os murais como "uma das maiores descobertas maias de todos os tempos". "Estamos entrando numa idade de ouro do estudo pré-clássico", avalia Stephen Houston, especialista em hieróglifos maias da Universidade Brown. Para ele, a pesquisa dos maias será marcada por uma fase anterior à descoberta dessas pinturas e uma fase posterior.

"San Bartolo empolga investigações mais profundas do período pré-clássico", disse Julia Guernsey, especialista em história da arte e iconografia maia da Universidade do Texas. Em seu livro Ritual and Power in Stone (Ritual e Poder em Pedra), a ser publicado em dezembro, Guernsey analisa vários exemplos de fachadas em estuque, murais pintados e monumentos entalhados que ilustram o desenvolvimento pré-clássico da iconografia dos conceitos maias da criação, do mundo espiritual e do poder.

QUADRIFÓLIO

Há um novo foco, disse Guernsey, num motivo comum em monumentos do período clássico que agora é cada vez mais reconhecido já em meados da era pré-clássica, de 900 a.C. a 300 a.C. Ele é conhecido como quadrifólio.

O desenho, parecido com um trevo de quatro folhas, é encontrado em arranjos de pedras, entalhado na pedra ou emoldurado por terra e argila pintada em locais cerimoniais.

Outros exemplos pré-clássicos são examinados em Izapa, onde há quadrifólios e monumentos datados entre 300 a.C. e 50 a.C. Um trono de Izapa é emoldurado por um quadrifólio. Imagens similares foram descobertas em Chalcatzingo, datando de 700 a.C.

Os arqueólogos dizem que o quadrifólio, muitas vezes em associação com canais e bacias d'água, pode ter sido parte da iconografia em cerimônias para os deuses da chuva e da fertilidade. Em outros casos, ele emoldura a entrada de uma caverna, talvez simbolizando a criação e o sobrenatural. Guernsey supõe que o quadrifólio, antes negligenciado, pode ter sido um objeto em exibições públicas nas quais o governante dançava e passava pelo centro aberto, num ritual que demonstrava seu poder de interceder perante os deuses, base de sua autoridade como líder.

ESCRITA MISTERIOSA

Um novo quebra-cabeça ainda sem solução é a escritura maia pré-clássica encontrada em San Bartolo. A coluna de dez hieróglifos, pintados em preto sobre gesso branco, sem dúvida contém escritos maias datados entre 300 a.C. e 200 a.C., dizem os especialistas. Por enquanto, os símbolos são indecifráveis.

Segundo Saturno e seus colegas, a coluna "mostra que um sistema de escrita maia desenvolvido era usado séculos antes do que se pensava". Houston, da Universidade Brown, concorda, afirmando que a sofisticação da técnica do escriba e o repertório de sinais sugerem que "o sistema não foi inventado no dia anterior".

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Querem que índio continue tutelado.

Autor: Arruda, Roldão
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/05/2009, Nacional, p. A6

Aldo Rebelo: deputado (PC do B-SP)

Roldão Arruda


Os índios brasileiros não são ouvidos pelas autoridades nos processos de demarcação de suas terras. O pior é que as demarcações ocorrem a partir de laudos antropológicos nem sempre confiáveis e sob pressão de organizações não-governamentais que insistem em tutelar os índios e apontar o Estado como ameaça à sua cultura. No conjunto isso estimula propostas secessionistas e põe em risco a integridade territorial do Brasil.

Em linhas gerais, esse foi o raciocínio que levou o deputado comunista Aldo Rebelo (PC do B) a apresentar na Câmara, em conjunto com seu colega Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), um polêmico projeto de lei que, se aprovado, obrigará o Executivo a submeter ao Congresso todos os processos de demarcação de terras indígenas. Na semana passada, em seu escritório político em São Paulo, o deputado, que já ocupou as cadeiras de ministro da Articulação Política e de presidente da Câmara, falou ao Estado, sobre o projeto e suas razões. A seguir, os principais trechos da conversa.

O que o levou a esse projeto, que transfere as demarcações do Executivo para o Legislativo?

O projeto não subtrai do Executivo a prerrogativa de demarcação das terras indígenas. Apenas o obriga a enviar a proposta ao Congresso, que analisa, promove as discussões, as negociações necessárias com as partes envolvidas. Depois a proposta é devolvida ao Executivo, na forma original ou modificada. É uma instância de negociação para todas as partes envolvidas, incluindo os índios, que não são ouvidos. O processo demarcatório é uma decisão unilateral da Funai (Fundação Nacional do Índio), que colhe o laudo - nem sempre rigoroso - de antropólogos e o submete ao Ministério da Justiça, que prepara o decreto de demarcação e encaminha ao presidente da República, que homologa.

Está mesmo dizendo que o governo não ouve os índios?

Não ouve. O caso da Raposa Serra do Sol é patente. Ali, um grupo grande de indígenas contestou a demarcação proposta pela Funai, mas não foi levado em conta.

A maioria dos índios era favorável à demarcação em área contínua.

Não creio. Pelo que apurei, em visitas à região, não havia maioria favorável. A relação entre os grupos de índios que vivem ali não é das mais amistosas e eles preferiam que a demarcação fosse em ilhas, onde cada tribo teria sua área demarcada, sem ser obrigada a conviver com outras. Isso também levava em conta as diferenças no estágio de evolução. Em Roraima existem indígenas que estão num estágio ainda próximo da coleta, da caça, e outros que são formados por pequenos fazendeiros, comerciantes.

O senhor falou que os laudos antropológicos que norteiam as demarcações nem sempre são rigorosos.

Ainda usando o exemplo da Raposa Serra do Sol, o laudo que deu origem àquela terra é eivado de fraudes. As mais diversas. Há fraude no censo que contabilizou a população indígena, na coleta de testemunhas, na contabilidade das malocas usadas como referência para a demarcação. Malocas localizadas na Guiana foram contabilizadas como se estivessem no Brasil. Tudo isso demonstra que é preciso uma autoridade que faça a mediação, para que não se cometam injustiças.

Falando em mediação, acha que os arrozeiros poderiam ter ficado na terra indígena?

Mas é evidente que sim. Já vi de tudo na vida. Já vi entrarem numa propriedade para desapropriá-la e trocá-la de mãos, como faz o socialismo, como fez Fidel Castro em Cuba. Mas destruir e imobilizar a capacidade produtiva, isso eu nunca vi. Como é possível transformar em crime a produção de arroz? Crime é contrabando, é narcotráfico.

Os arrozeiros não tinham títulos legais das terras.

Isso podia ser resolvido. Era só chegar e estabelecer um preço para eles. Aliás, porque os próprios índios não podiam arrendar aquelas terras? Obter algum tipo de benefício?

Por que isso não aconteceu?

Porque querem que o índio continue tutelado.

Afirma-se que, se seu projeto for aprovado, não haverá mais demarcação: serão todas barradas pela bancada ruralista do Congresso.

Acredito que o Congresso vai agir como tem agido, considerando em primeiro lugar a defesa da população indígena. Tudo que está sendo feito hoje decorre de uma autorização do Congresso - o Congresso Constituinte, que incluiu na Constituição a garantia e a defesa dos direitos indígenas. Eles sofrem de fato ameaças na sobrevivência física e na sobrevivência de suas culturas - daí a necessidade de demarcar suas terras, protegê-los. Mas ao mesmo tempo há necessidade de integrá-los; e não de estimular qualquer sentimento secessionista.

Acha que os antropólogos estimulam sentimentos secessionistas?

A antropologia, um ramo das ciências sociais, foi muito desenvolvida no auge do império britânico. O império estimulava, porque, por meio da ciência conhecia melhor os povos a serem subjugados. Em seus primeiros momentos, ela procurava convencer os chamados povos tribais, na África e em outros continentes, a se submeterem aos padrões da sociedade ocidental - porque isso interessava ao domínio britânico. Quando os impérios coloniais se desintegraram e essas sociedades tribais passaram a integrar embriões de Estados nacionais, a antropologia passou a aconselhá-los a permanecerem em seu estágio tribal, afirmando que os Estados nacionais eram uma ameaça. E é isso que, em resumo, vejo acontecer no Brasil. Dizem para os índios: continuem no seu estágio, o Estado nacional é uma ameaça a vocês. Eu acho que não há futuro para essas populações fora do Estado nacional brasileiro. O que vão constituir? Estados fantoches?

Pelo que diz, existe uma ameaça à segurança nacional.

No ano 2000, Orlando Villas Boas, que dedicou a vida aos indígenas, deu um depoimento a uma emissora de TV, hoje acessível pela internet, no qual fez uma advertência que é quase uma profecia. Disse que jovens ianomâmis estavam sendo levados para os Estados Unidos, onde iam ser treinados e aprender inglês. Depois retornariam ao Brasil para pedir a criação de um território próprio, um Estado. Nesse momento receberiam a proteção da ONU, que transferiria a tutela dessa população a uma grande nação. Ele dizia: "Eles não estão interessados nos ianomâmis, mas nas riquezas que há no subsolo."

Não acha isso fantasioso?

Não. No início do século 20 o Brasil perdeu 20 mil quilômetros quadrados do antigo Território de Roraima, em área consagrada, já demarcada como parte do território brasileiro. Inicialmente a Inglaterra enviou uma missão geográfica à região. Depois apareceu uma missão religiosa, que catequizou os índios, que, por sua vez, pediram a proteção da Inglaterra. Foi aí que os ingleses impuseram o litígio sobre a área. Ele foi submetido à arbitragem do rei da Itália, que dividiu o que era nosso: deu 20 mil quilômetros quadrados para a Inglaterra e deixou 20 mil para o Brasil. O território brasileiro sempre foi cobiçado.

O Brasil é signatário de convenções internacionais que tratam da questão indígena. Acha que podem constituir risco para a segurança nacional?

Sim. Principalmente a convenção da ONU que reconhece a soberania das populações indígenas.

Como vê a ação das ONGs?

O problema das ONGs é que veem os índios como instrumentos para estudos de caso de antropologia. Os índios dentro da reserva têm quase o status de uma cutia, uma paca, um bicho. Eles não têm direitos. São duplamente tutelados, pelas ONGs e pelo Estado.

Organizações envolvidas com questões indígenas dizem que a prioridade do Congresso deveria ser a votação do Estatuto do Índio.

Nós devemos votar o estatuto, demarcar as áreas indígenas, assegurar os direitos dos índios, garantir a presença do Estado no meio deles. Nós temos uma sub-Funai terceirizada, que praticamente entrega às ONGs a assistência aos índios. Queremos uma Funai forte, com uma política própria, que reconheça as dificuldades dessas populações. Como a sociedade nacional deve se comportar diante do índio? Segregando ou integrando? Eu defendo a integração.

Mesmo para os índios isolados, sem contato com outras culturas? A nossa política sempre foi de fazer contato. Como é que o Estado vai prestar assistência a esses índios? Como vai levar assistência médica?

Não sente receio de ser identificado com grupos conservadores?

Não. Minha posição sempre foi em defesa da democracia, do socialismo e do Brasil.

Quem é: Aldo Rebelo

É formado em jornalismo e está em seu quinto mandato consecutivo como deputado federal pelo PC do B-SP

Já foi presidente da Câmara e ministro do governo Lula

Nasceu em Viçosa, Alagoas, e tem 53 anos


CRÍTICA: "Nós temos uma sub-Funai terceirizada, que na prática entrega às ONGs a assistência aos índios"

DESTINO: "Não há futuro para essas populações fora do Estado. O que vão constituir? Estados fantoches?"

PARÂMETROS: "Os índios dentro da reserva têm quase o status de uma cutia, uma paca, um bicho"

domingo, 9 de agosto de 2009

Presidente Lula cria decreto que provoca disputa por terra.

Título: Decreto de Lula criou disputa por terra, diz Jungmann
Autor: Marchi, Carlos
Fonte: O Estado de São Paulo, 13/08/2007, Nacional, p. A6

Deputado diz que quilombolas vão brigar pelo mesmo orçamento do Incra para assentar os sem-terra

O reconhecimento de terras de comunidades quilombolas cria sério impasse institucional, afirmou o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), ex-ministro do Desenvolvimento Agrário no governo FHC. Para ele, a regulamentação feita pelo governo Lula para reconhecer os territórios quilombolas estabelece uma disputa orçamentária entre os potenciais remanescentes de quilombos e os sem-terra. ¿É um orçamento só para assentar sem-terra e quilombolas¿, questionou.

Para a deputada Maria do Rosário (RS), vice-presidente nacional do PT, ¿o cobertor orçamentário pode ficar curto, mas a concessão de terra a quem não a tem é uma obrigação do Estado¿. De acordo com ela, são tão legítimas as reivindicações feitas pelos sem-terra como as dos quilombolas. Ontem, o Estado mostrou que 3.524 comunidades reivindicam 25 milhões de hectares que seriam de antigos quilombos, uma área do tamanho do Estado de São Paulo.

DOIS ERROS

Jungmann diz que a regulamentação do artigo 68 das Disposições Constitucionais Transitórias, que prevê o reconhecimento de antigos quilombos, foi equivocada nos governos FHC e Lula. O governo passado definiu que o laudo antropológico para o reconhecimento de antigos quilombos e o assentamento das comunidades deveria ser feito pelo Incra, que, segundo o deputado, não tem conhecimento em antropologia.

Depois o governo FHC transferiu o laudo para a Fundação Palmares, deixando a desapropriação e o assentamento com o Incra. ¿Houve um descasamento, porque o mérito passou a ser julgado na fundação, mas o orçamento que custeia a operação era do Incra¿, disse. O erro do governo Lula, segundo o deputado, foi ampliar o conceito de direito dos quilombolas. ¿Antes se exigia a posse continuada da terra pelos quilombolas, mas o governo Lula acabou com isso e tornou qualquer terra passível de questionamento.¿

Além disso, questiona Jungmann, a Fundação Palmares não tem contraditório na fixação do mérito: como ela defende direitos da população negra, estará sempre simpática a conceder as solicitações das comunidades negras que se auto-intitulam quilombolas. ¿Há casos em que a ocupação continuada está provada, como as comunidades do Rio Trombetas, no Pará, e do Rio das Rãs, no oeste da Bahia. Mas um número grande dos casos que estão surgindo agora não comprova ocupação continuada¿, diz Jungmann.

Maria do Rosário registra que o tema da reparação das comunidades negras é muito recente: ¿Mas a dívida que existe é tão grande que o que está sendo assegurado aos negros será sempre menos que o justo.¿ Ela afirmou que secularmente a responsabilidade do Estado ¿tem sido muito negligenciada com as populações negras¿.

FRASES

Raul Jungmann (PPS-PE) deputado

¿É um orçamento só para assentar sem-terra e quilombolas¿

Maria do Rosário (PT-RS) deputada

¿O cobertor orçamentário pode ficar curto, mas a concessão de terra a quem não a tem é uma obrigação do Estado¿

Mitologia, Simonides.

Esta obra pertence a A. S. Franchini e Carmen Seganfredo.

Havia, certa feita, um poderoso rei chamado Escopas. Seu reino era o da Tessália e não havia ninguém audaz o bastante para contestar o seu poder. Riquezas choviam dia e noite sobre sua cabeça, potentados de reinos vizinhos vinham quase todos os dias prestar-lhe vassalagem, e ainda assim isto não era o bastante para ele sentir-se completa, suficiente e absolutamente feliz.
"O que falta ainda?", perguntava-se todos os dias Escopas.
Um dia, entretanto, escutando a música que saía da lira de Simônides, príncipe dos poetas de toda a Grécia, Escopas compreendeu tudo:
— É isto: um poema épico! — disse ele, dando um pulo de alegria. Imediatamente mandou chamar o poeta.
— Simônides, príncipe dos poetas! — disse o rei, ao vê-lo. — Quero que componha para mim um magnífico poema, que celebre em versos inesquecíveis as minhas gloriosas e inexcedíveis façanhas. Quero que seja de tal forma extraordinário que seja cantado e repetido por todas as gerações futuras. É capaz disto, por certo?
— Sem dúvida, poderoso rei! — disse Simônides, já elaborando mentalmente os primeiros versos da imensa epopéia. Seria uma longa peregrinação, que abarcaria desde os feitos gloriosos dos mais antigos ancestrais do rei, entremeada de muitas digressões, que, por comparação, somente elevariam o mérito do homenageado, até chegar ao cerne do poema, um longo e exaltado canto que ergueria até as nuvens as virtudes e méritos do maravilhoso rei.
Simônides, entretanto, consumiu o cérebro durante um ano inteiro para achar alguma virtude naquele amontoado de crimes e barbáries que era a história dos antepassados do rei. Ambição, inveja, ciúmes, assassínios, estupros, parricídios — havia de tudo naquelas antigas crônicas, menos um feito justo e humano, por mais singelo que fosse, para ser narrado. Mas graças ao seu talento superior conseguiu transformar em beleza todas aquelas selvagens atrocidades.
No dia aprazado para a primeira audição de seu maravilhoso poema, estavam reunidos, enfim, num imenso salão, o rei e toda a sua corte. O tirano Escopas, refestelado em seu trono, sentia um friozinho agradável no estômago. Um gongo soou e o poeta maravilhoso adentrou o recinto sob uma chuva calorosa de aplausos.
— Escopas, poderoso rei da Tessália, temido e amado pelos súditos e pelos reis de toda a Grécia! — disse Simônides, alteando a voz. — Aqui está o produto do meu suado labor, que não tem outro fim senão o de contar em versos perfeitos a trama sublime que as Parcas divinas teceram para compor o tapete glorioso de vossa vida!
Tão logo os aplausos silenciaram, Simônides deu início à leitura da sua maravilhosa epopéia. Todos os circunstantes bebiam suas palavras como quem sorve um saboroso vinho, até que o poeta entrou numa vereda do seu poema, uma longa divagação acerca dos irmãos Castor e Pólux, exaltando as suas virtudes guerreiras, mas que pouco tinham, na verdade, a ver com as do homenageado.
Tais divagações não eram raras no poeta, e seria de se supor que um mortal comum se sentisse feliz em ver-se comparado aos dois famosos filhos de Leda. A vaidade do rei, porém, não admitia comparações, mesmo com os filhos de um deus.
Escopas, sentado à mesa de banquete, entre seus cortesãos e aduladores, resmungava insatisfeito:
— Que têm a ver as proezas dos gêmeos com as minhas?
Simônides, entretanto, entregue à recitação da comprida ode, continuava, imperturbável, a exaltar os feitos sublimes dos Dióscuros.
A leitura do poema estendeu-se, ainda, por longo tempo, até que finalmente o poeta pôs um ponto final na brilhante epopéia. Os aplausos espocaram, entusiásticos, por todo o salão, mas ficara bem evidente a todos — em especial, ao próprio rei — que Castor e Pólux saíam da declamação muito mais exaltados e glorificados do que ele, objeto primeiro da homenagem.
Era hora, agora, do rei ofertar ao poeta a sua prometida paga. Simônides, ainda ofegante da longa recitação, aproximou-se reverentemente do trono do rei, que havia aberto o seu baú de riquezas. Para sua surpresa, entretanto, Simônides viu o rei lhe entregar apenas a metade do conteúdo, ficando com o baú e a outra metade para si próprio.
— Aqui está o pagamento pela minha parte na sua obra — disse Escopas, com um sorriso irado no rosto. — Castor e Pólux, sem dúvida, pagarão pela parte que lhes diz respeito.
Uma gargalhada feroz e ululante estourou em todo o recinto, fazendo com que o poeta, corado e humilhado, retornasse cabisbaixo ao seu lugar.
Durante o resto da noite Simônides esteve assim, abatido e envergonhado, e por onde quer que andasse escutava sempre pelas costas risinhos fungados de deboche. Ninguém ousou fazer-lhe qualquer elogio, com medo de que a imprudência pudesse chegar aos ouvidos do rei insatisfeito.
Assim estava perambulando o poeta pelos corredores do palácio quando viu um lacaio se aproximar e lhe dizer:
— Senhor, há dois homens lá fora, a cavalo, que desejam lhe falar com toda a urgência.
— Quem são e o que desejam de minha pessoa? — indagou Simônides.
— Não se identificaram, senhor — disse o lacaio -, mas disseram que a sua vida depende de ir procurá-los, e a toda pressa.
Simônides saiu para os jardins, mas não encontrou ninguém à sua espera.
— Estranho... — disse o poeta, pensativo. — Estarão alguns gaiatos armando outra brincadeira para me ridicularizar ainda mais?
Simônides estava já regressando ao palácio quando escutou um ruído terrível partir lá de dentro. Diante de seus olhos viu a cúpula do palácio ruir inteira para dentro de onde estava situado o salão de banquetes — lugar onde estivera há questão de apenas alguns segundos.
Quando chegou lá, encontrou tudo em ruínas e, em meio aos destroços, o corpo dilacerado e esmagado do vaidoso Escopas. Entre os seus dentes havia uma moeda — o óbolo dos mortos — e junto dele estava o seu baú, inteiramente vazio. Em volta dele jaziam os corpos de todos os demais convidados, sepultados sob pilhas de escombros ensangüentados. Ao se informar sobre a aparência dos jovens que o haviam procurado, Simônides não teve dúvida nenhuma de que não eram outros senão os próprios Castor e Pólux, que tinham vindo para receber do rei a sua parte.

sábado, 1 de agosto de 2009

Apolo e a Serpente Píton.

Esta obra foi elaborada e criada por : A. S. Franchini e Carmen Seganfredo.

É tudo verdade, Juno: Latona está grávida do seu esposo, Júpiter!
Íris, a mensageira e confidente de Juno, fora quem descobrira a novidade.
— Pois quero esta mulher bem longe de qualquer terra, compreendeu? -esbravejou Juno, enciumada. — Bem longe de qualquer terra.
"Bem longe de qualquer terra", pensou íris. "É um bocado longe."
Latona, com o ventre dolorido, foi obrigada, assim, a percorrer o mundo todo — atravessando, exausta, lugares como o Quio, a Trácia, a Ática, a Eubéia, as ilhas do mar Egeu, sem jamais receber abrigo de quem quer que fosse, em lugar algum. E como se isto não bastasse, atrás dela ainda ia Píton, uma terrível serpente encarregada de devorar os seus filhos. Sem dar um segundo de descanso, a pavorosa serpente empenhou-se na sua tarefa, sem nunca, entretanto, conseguir alcançar o seu objetivo maior.
Assim, depois de muito vagar, Latona acabou por chegar à ilha de Ortígia, onde encontrou, finalmente, um abrigo. Ortígia era uma ilha flutuante, não estando fixa, portanto, em lugar algum, não fazendo parte da terra.
Ali, durante nove dias e nove noites, Latona gemeu sob o império da dor. Mas Ilícia, a deusa que preside os partos, soube dos sofrimentos atrozes pelos quais a pobre mãe passava e resolveu socorrê-la.
— O filho de Latona será o mais belo dos deuses, e para mim será uma honra excelsa presidir o seu nascimento — disse ela às amigas, antes de partir.
E assim foi. Depois de intenso sofrimento, Latona viu seus trabalhos duplamente recompensados: de seu ventre saíram não um, mas dois filhos — um belo menino, de nome Apólo, e uma graciosa menina, chamada Diana.
— Aí tens o dia e a noite, um em cada braço — disse Ilícia, ternamente. Apólo, de pele alva e louros cabelos, de fato era a representação perfeita do sol e do dia, enquanto que Diana, de cabelos negros caídos sobre um colo faiscante, representava a lua envolta pela noite.
Júpiter deu a seus filhos muitos presentes, mas o que mais lhes agradou foi um maravilhoso arco confeccionado por Vulcano. Desde este dia Diana afeiçoou-se de tal modo ao seu exercício, que acabou se tornando a deusa da caça. Quanto a Apólo, tinha em mente, antes que tudo, vingar sua mãe.
— Diga-me, meu pai, onde está a terrível serpente que perseguiu tão cruelmente a minha mãe — disse ele, com os olhos postos no céu -, e irei matá-la com minhas próprias setas.
Latona e seus filhos abandonaram a ilha — que passou a se chamar, desde então, Delos, ou seja, "ilha luminosa", em homenagem ao deus da luz e do sol -e, após vários percalços, chegaram enfim ao seu destino.
— Eis o monte Parnaso, meus filhos — disse Latona, abraçada aos dois. Mas aquele local magnífico, repleto de montanhas e abundante vegetação, escondia também um horror. Era ali que a serpente Píton, filha da Terra, vivia, instalada bem ao pé do monte Parnaso em um imundo covil.
— Chegou a hora, maldita serpente — disse Apólo, enganchando uma flecha em seu poderoso arco -, de acertarmos as nossas contas.
De dentro da caverna partiu um urro tremendo, que fez desmoronar muitas montanhas ao redor. Logo em seguida um bafo pestilencial, um misto de fogo e de sangue, foi expelido de dentro, incendiando tudo que estivesse à sua frente. A serpente medonha escorregou para fora da cova como se fosse uma língua em chamas expelida pela goela escancarada da montanha.
Apolo, após subir em cima de um rochedo, estendeu o mais que pôde a corda de seu arco e mirou no abismo de sua boca infernal. A fera, contudo, desviou-se da seta, dando um salto inesperado e rolando de lado sobre a relva, que ficou toda crestada.
— Apolo, meu filho, cuidado! — gritava sua mãe, abraçada a Diana, que queria se desvencilhar dos braços da mãe para ir ajudar o irmão.
— Não se meta nisto, minha irmã! — bradou o deus solar. — Você é muito nova e frágil para enfrentá-la!
Apólo nem se dava conta de que tinha a mesma idade da irmã, mas naquele momento foi a única coisa que lhe ocorreu para manter a salvo as duas mulheres.
A serpente agora estava completamente em pé — parecia impossível, mas estava completamente ereta, como uma gigantesca palmeira -, e seu ventre, originalmente claro, estava todo coberto do sangue seco e dos ossos esmagados de antigos e horrendos festins. Um silvo ensurdecedor passou sobre o rosto de Apólo, como um vento quente e mórbido que um vulcão houvesse expelido em seu rosto.
Píton entesou o seu corpo e lançou um bote quase certeiro sobre a rocha onde o deus do sol se mantinha precariamente equilibrado. Um grande dente amarelado da serpente ficou cravado sobre a rocha, como se fosse uma gigantesca espada enterrada na pedra. Dela escorria um líquido pestilencial da cor do âmbar e que exalava um odor terrivelmente nefasto.
Apólo foi cair sobre a saliência de um penedo, ainda entontecido pelo bafo mefítico da sua cruel inimiga. A serpente Píton, após relancear a cabeça em várias direções, arregalou suas grandes pupilas horizontais: uma centena de línguas fendidas saíram ao mesmo tempo de sua boca e chicotearam o ar em todas as direções. A temível Píton farejara novamente a sua presa.
Mas antes que volvesse sua cabeça na fatídica direção, Apólo já estava em pé outra vez. Retesando ao mesmo tempo em seu arco três de suas mais afiadas setas, Apólo esticou a corda até que ela quase estalasse.
— Serpente maldita, aqui está o seu castigo! — disse o deus, despedindo as três setas, que partiram sibilando pelo ar.
Já no caminho as poderosas setas foram duelando com as línguas serpenteantes da víbora, e uma chuva delas caiu do alto, decepadas pela velocidade das setas. Em seguida, cada qual tomando seu caminho foi buscar um alvo diferente: a primeira foi alojar-se no olho esquerdo da víbora; a segunda penetrou em seu peito, ausente de escamas, enterrando-se em seu coração; e finalmente a terceira entrou-lhe pela boca adentro, tirando-lhe o hausto da vida. Como uma palmeira que tomba, a serpente Píton caiu, provocando um grande estrondo, que fez tremer a Terra durante oito dias.
Apólo vencera. Tomando então sua lira — que Mercúrio lhe dera de presente -, ele entoou sua canção de vitória, abraçado à mãe e à irmã. Disse a elas, triunfante:
— Aqui enterrarei a terrível serpente, e sobre seu túmulo erguerei um sagrado templo, além de um oráculo, que será em breve o mais famoso de todos.
Era o oráculo de Delfos, local onde todo mortal iria sondar os irrevogáveis decretos das Parcas, as deusas que presidem ao destino.

sábado, 25 de julho de 2009

Mitologia - Saturno

Numa era muito antiga — tão antiga que antes dela só havia o caos — o mundo era governado pelo Céu, filho da Terra. Um dia, este, unindo-se à própria mãe, gerou uma raça de seres prodigiosos, chamados Titãs. Ocorre que o Céu — deus poderoso e nem um pouco clemente — irritou-se, certa feita, com as afrontas que imaginava receber de seus filhos. Por isto, decidiu encerrá-los nas profundezas do ventre da própria esposa, à medida que eles iam nascendo.
— Aí ficarão para sempre, no ventre da Terra, para que nunca mais ousem desafiar a minha autoridade! — exclamou, colericamente, o deus soberano.
A Terra, subjugada, teve de segurar em suas entranhas, durante muitas eras, aquelas turbulentas criaturas e suportar, ao mesmo tempo, o assédio insaciável e ininterrupto do marido. Um dia, porém, farta de tanta tirania, decidiu a mãe do mundo que um de seus filhos deveria libertá-la deste tormento. Para tanto escolheu Saturno, o mais jovem de seus rebentos.
— Saturno, meu filho — disse a Terra, lavada em pranto -, somente você poderá libertar-me da tirania de seu pai e conquistar para si o mando supremo do Universo!
O jovem e ambicioso Titã sentiu um frêmito percorrer suas entranhas.
— Diga, minha mãe, o que devo fazer para livrá-la de tamanha dor! — disse Saturno, disposto a tudo para chegar logo à segunda parte do plano.
A Terra, erguendo uma enorme foice de diamante, entregou-a ao filho.
"Tome e use-a da melhor maneira que puder!", disseram seus olhos, onde errava um misto de vergonha e esperança.
Saturno apanhou a foice e não hesitou um instante: dirigiu-se logo para o local onde seu velho pai descansava. Ao chegar no azulado palácio erguido nos céus, encontrou-o ressonando sobre um grande leito acolchoado de nuvens.
— Dorme, o tirano... — sussurrou baixinho.
Saturno, depois de examinar por algum tempo o rosto do impiedoso deus, empunhou a foice e pensou consigo mesmo: "Realmente... demasiado soturno."
E fez descer o terrível gume, logo abaixo da cintura do pobre Céu.
Um grito terrível, como jamais se ouvira em todo o Universo, ecoou na abóbada celestial, despertando toda a criação.
— Quem ousou levantar mão ímpia contra o soberano do mundo? — gritou o Céu, com as mãos postas sobre a ensangüentada virilha.
— Isto é pelos tormentos que infligiu à minha mãe, bem como a mim e a meus irmãos — respondeu Saturno, ainda a brandir a foice manchada de sangue.
Os testículos do Céu, arrancados pelo golpe certeiro da foice, voaram longe e foram cair no oceano, com um baque tremendo. Em seguida, o deus ferido caiu, exangue, sobre seu leito acolchoado, sem poder dizer mais nada. As nuvens que lhe serviam de leito tingiram-se de um vermelho tal que durante o dia inteiro houve como que um infinito e escarlate crepúsculo. Saturno, eufórico, foi logo contar a proeza à sua mãe.
— Isto é que é filho — disse a Terra, abraçada ao jovem parricida. Imediatamente foram soltos todos os outros Titãs, irmãos de Saturno. Este, por sua vez, recebeu a sua recompensa: era agora o senhor inconteste de todo o Universo.
Quando a noite caiu, entretanto, escutou-se uma voz espectral descer da grande cúpula côncava dos céus:
— Ai de você, rebento infame, que manchou a mão no sangue do seu próprio pai! Do mesmo modo que usurpou o mando supremo, irá também um dia perdê-lo...
Saturno assustou-se a princípio, mas em seguida ordenou a seus pares que recomeçassem os festejos.
— Ora, ameaçazinhas... Deus morto, deus posto! — exclamou, com um riso talhado no rosto.
Mas aquela profecia, irritante como um mosquito, ficara ecoando na sua mente, até que Saturno, por fim, reconheceu-se também meio soturno:
— Será que uma vitória, neste mundo, não pode ser nunca completa?

Ecoturismo e Mudança Social na Amazõnia Rural.

Ecoturismo e Mudança Social na Amazônia Rural: efeitos sobre o papel da mulher e as relações de gênero
Nelissa Peralta, Edna Ferreira Alencar


Resumo


O ecoturismo tem sido desenvolvido com o objetivo de melhorar a qualidade de vida da população, principalmente em áreas rurais, mas há poucas pesquisas analisando o que os projetos representam para os indivíduos. O artigo discute as mudanças sociais na esfera doméstica da unidade domiciliar principalmente no que se refere ao papel da mulher e às relações entre gêneros. A pesquisa foi realizada em uma Reserva de Desenvolvimento Sustentável na região do Médio Solimões, utilizando como metodologia a observação participante e entrevistas abertas. Os resultados da pesquisa demonstram que o ecoturismo gerou renda de forma significativa, aumentando em 148% o poder de compra em uma das comunidades estudadas. O acesso à renda provocou maior independência econômica para as mulheres, maior poder na alocação de recursos, maior acesso a redes de comunicação fora da esfera doméstica e maior reflexão sobre as desigualdades entre os gêneros, mas não necessariamente uma diminuição destas desigualdades.

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segunda-feira, 20 de julho de 2009

Academia Brasileira de Ciências, e a opnião do Presidente Fernando Henrique Cardoso.

Mensagem do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, lida pelo Ministro de Estado da Ciência e Tecnologia
2/05/2009.


Mensagem do Senhor Presidente da República por ocasião de sessão solene da Academia Brasileira de Ciências Rio de Janeiro, 28 de maio de 2001

É com grande satisfação que me dirijo aos participantes desta sessão em que são empossados os novos membros eleitos da Academia Brasileira de Ciências. Esta é uma instituição que tem tradição, e é símbolo do compromisso com o avanço da ciência e da tecnologia no Brasil, desde 1916.

A tradição, em matéria científica, é sempre algo ambíguo. Por um lado, é essencial o contato com o passado, o conhecimento do que já se fez, a herança das conquistas acumuladas pelas gerações anteriores. Ao mesmo tempo, a ciência envolve necessariamente abertura para o futuro, para o novo, para a descoberta e a inovação.

A Academia Brasileira de Ciências tem sabido realizar uma síntese muito feliz dessas duas exigências. Tem feito isso, entre outras razões, porque é uma instituição que soube valorizar o mérito científico real, e continua a sabê-lo, como se pode apreciar pela qualidade da escolha dos novos acadêmicos.

A Academia é um fator de congregação da comunidade científica. Tem favorecido o contato entre essa comunidade, de um lado, e a sociedade civil e o Governo, de outro. É importante que a ciência tenha voz ativa, tenha presença no cenário nacional.

Os programas da Academia têm dado ênfase, por exemplo, a questões ambientais, ao problema da biodiversidade, o que é indispensável no momento atual. Aprimoram a organização e administração da informação científica, como no projeto "ABCDados", de especial importância para a área da saúde. Ajudam a preservar a memória científica nacional, com a organização de documentos de valor histórico e a realização de entrevistas e depoimentos de cientistas brasileiros.

Um programa que me parece de especial interesse é o que se destina a fomentar a educação científica. O Brasil vem empreendendo um esforço extraordinário de fortalecimento do ensino público, do acesso das crianças à escola, enfim, dos diversos elementos indispensáveis para que o País dê um salto qualitativo na educação. Esse salto já começou.

É fundamental que o progresso na educação seja não apenas quantitativo, mas qualitativo. As crianças e jovens brasileiros devem ter acesso ao que há de melhor no pensamento e no conhecimento. Além disso, a Academia tem uma participação de relevo em programas de cooperação regional e internacional, o que é essencial no momento em que o Brasil se prepara para os desafios do século XXI. Parte desses desafios consiste em que nenhum país pode se fechar em si mesmo. A ciência - que ocupa posição tão central na economia e no desenvolvimento - não é nacional, é universal, é uma conquista do gênero humano. E o Brasil do século XXI quer estar em sintonia com essa universalidade, quer estar nas fronteiras do conhecimento.

Meus parabéns a todos os membros da Academia, muito especialmente os que hoje se incorporam, entre os quais conto vários amigos, e meus votos de êxito cada vez maior em suas atividades. Quero, particularmente, congratular o Professor Eduardo Moacyr Krieger, cuja recondução à presidência é uma garantia de fortalecimento ainda maior da Academia.

Humanismo Ecológico.

Existe contradição entre desenvolvimento e meio ambiente? Aqui está a questão fundamental do século XXI. No passado, a ideologia do progresso subordinou a Natureza ao crescimento econômico. Hoje, com as mudanças climáticas, a nave Terra dá seu troco.

Foi José Lutzemberger, no Brasil, quem melhor utilizou o conceito da ¿nave finita¿ para denunciar a dilapidação dos recursos naturais. No Manifesto Ecológico, publicado em 1976, o agrônomo gaúcho afirmava que o homem, promotor do crescimento desenfreado, carregava consigo o germe da destruição.

O ecologismo, quando surgiu, se opôs ao paradigma econômico que dominava tanto o capitalismo quanto o comunismo. Nem esquerda nem direita entenderam direito o surgimento do movimento ecológico. Humanismo mais tecnologia, misturado com a prepotência, resultou na ¿religião do progresso¿. Um equívoco atroz.

O efeito estufa, uma verdade inconveniente, segundo Al Gore, é simbólico para causar um despertar definitivo, talvez a última chance. Nenhuma ideologia, nenhum sistema, nenhuma religião, tem sido capaz de enfrentar o dilema da sobrevivência humana. Chegou a hora de formular novo conceito, um humanismo ecológico. A razão, sim; a ciência, sim; a arrogância, não.

O senhor da razão precisa tomar umas pílulas de humildade, e mudar sua postura, suas atitudes, suas ações frente aos dilemas expostos pela Natureza. E não adianta dourar essa pílula: sem reduzir a pressão populacional não se vence essa batalha. Na tarefa de salvar a Terra, convencer a Igreja a aderir ao controle da natalidade é imprescindível.

Um grande desafio do humanismo ecológico será vencer o raciocínio banal, dualista, que cria polaridades e favorece o beco sem saída. Ora, no estudo da ecologia se aprende que a simbiose é uma relação entre seres vivos em que prevalecem vantagens mútuas. Ao contrário da predação, quando uma espécie se sobrepõe a outra, na simbiose ambos ganham. A complementaridade substitui a subordinação.

Em qualquer ramo de atividade, urbano ou rural, a grande tarefa é saber incorporar a dimensão ambiental ao seio da produção, resumindo as duas equações numa só. Isso exigirá inteligência e desprendimento capazes de vencer dualismos e negar oposições. Trata-se de somar forças, unir conceitos, quebrar paradigmas.

Discute-se o impacto ambiental das grandes obras no país. O raciocínio bestial, apimentado pela política, novamente cria falsa polaridade. Produzir energia ou preservar a biodiversidade. Ora, os dois ao mesmo tempo. Técnicos da matéria dispõem de conhecimento para saber mitigar os efeitos danosos das intervenções ao meio ambiente, sem comprometer o futuro. O licenciamento ambiental pode ser rígido, e também mais rápido. O resto é incompetência da burocracia. Ou, então, o velho esquema de criar dificuldades para vender facilidade.

Na agropecuária, em que se questiona principalmente a produção de soja e de carne bovina na Amazônia, ou a produção será sustentável, ou não valerá a pena semear. Nem sequer, logo mais, haverá mercado. Ao contrário de desmatar, carece agora recompor o desflorestamento estúpido realizado no passado. É crucial, também, a conservação do solo e dos recursos hídricos.

Passou a época de discutir se preserva ou produz. Há que se produzir conservando.

¿Namorando a Terra¿ é o título de um notável livro de René Dumond. Nele, o francês proclama sua confiança na capacidade de recuperação ambiental da Terra. O livro é, ao mesmo tempo, conforme reconhece o autor, doce e amargo. Ele aposta na superação do dilema entre o homem e o meio ambiente.

Essa convergência, entre a ecologia e a antropologia, virá em duas frentes. Por um lado, o ambientalismo, após sua fase romântica, procurando resultados concretos. De outro, o produtivismo aprendendo, na marra, que o progresso não pode ser uma promissória contra o futuro.

Basta investir na educação ambiental.


XICO GRAZIANO é deputado federal (PSDB-S). E-mail: xicograziano@terra.com.br.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Paleontologia.

Um crocodilo que media 12 metros do focinho à cauda > o equivalente à altura de um prédio de quatro andares - e nadava pelas águas do Rio Orinoco, na Venezuela, é uma das 20 espécies de animais que desapareceram do planeta milhões de anos atrás e só agora se tornarão conhecidas. O animal gigante foi apresentado no 2.º Congresso Latino-Americano de Paleontologia de Vertebrados, que aconteceu no RJ em 2005. Das 20 "novas" espécies, 10 são dinossauros. As demais são mamíferos, répteis e peixes pré-históricos.

O evento serviu para que os paleontólogos discutissem seus trabalhos com colegas antes de publicá-los em revistas científicas internacionais.
O crocodilo venezuelano, que viveu há 8 milhões de anos, tem apenas o primeiro nome: Purussaurus. É primo de dois outros crocodilos também extintos, um brasileiro (Purussaurus brasiliensis) e um colombiano (Purussaurus neivensis).

Outra espécie que foi apresentada no congresso é uma pequena tartaruga, de 16 centímetros de comprimento, que conviveu com os dinossauros há 110 milhões de anos. É brasileira. Foi encontrada recentemente na região do Cariri, no Ceará, um dos mais importantes depósitos de fósseis do mundo.

CALENDÁRIO INTERNACIONAL

Organizado pelo Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o evento colocou o Brasil pela primeira vez no calendário internacional da paleontologia. Entre os participantes, estão pesquisadores de renome mundial, como o americano Paul Sereno, o inglês Michael Benton e o argentino Jorge Calvo.

Mais de 200 trabalhos - sobre novos animais, evolução das espécies, migração de dinossauros e até turismo científico - foram apresentados ao longo dos três dias, num hotel da Praia de Copacabana. O 1.º Congresso Latino-Americano de Paleontologia de Vertebrados ocorreu em 2002, no Chile.

CAÇA AOS FÓSSEIS

Paleontólogos são pesquisadores na maioria das vezes graduados em biologia ou geologia cujo trabalho é sair em expedições atrás de vestígios de animais ou vegetais que foram conservados ao longo do tempo. A idade do objeto costuma ser calculada por meio da datação das camadas de rocha que o envolvem. Uma das partes mais difíceis do trabalho é separar fóssil e rocha, para que ele possa ser estudado no laboratório. O casco da tartaruga encontrada no Ceará, por exemplo, foi tratado durante oito meses e ainda não está completamente livre das rochas.

Num dos simpósios do congresso, foi debatido o uso de novas tecnologias no reconhecimento dos fósseis, como aparelhos de tomografia e de escaneamento a laser. Até a robótica foi apresentada no evento, como forma de ajudar a compreender como os animais que não existem mais se movimentavam. O argentino Hugo Pailos, do Laboratório de Animatrônica da Universidade Nacional de Córdoba, apresentau um dos animais mais esperados do congresso: um robô em tamanho real do Tapejara imperator, um pterossauro (réptil voador). Também foi exposto a réplica do Microraptor, um minúsculo dinossauro com penas.

Para os participantes brasileiros, o congresso foi importante para tornar mais conhecida e incentivar a paleontologia no País.

"Existe muita coisa sobre o nosso passado que ainda não foi descoberta", diz o professor da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb) Douglas Riff, um dos paleontólogos que estudaram o crocodilo da Venezuela. "Mas ainda falta dinheiro e incentivo do governo para que possamos sair mais a campo e encontrar novas espécies", completou o biólogo Gustavo Ribeiro de Oliveira, do Museu Nacional, o descobridor da tartaruga do Cariri.

terça-feira, 14 de julho de 2009

A índia que promete se transformar em potência.

MUMBAI, ÍNDIA - Em seu conto Moti Guj Amotinado, o escritor anglo-indiano Rudyard Kipling explica que os elefantes têm uma maneira bastante peculiar de se locomover: "Elefantes não galopam. Quando querem correr, eles se movem a partir de diferentes relações de velocidade". O escritor ressalta que, caso queira acompanhar um trem expresso em plena velocidade, um elefante conseguirá fazê-lo, à sua própria maneira. A descrição de Kipling reflete com precisão o que se passa com a própria Índia, país com uma população de mais de 1 bilhão de pessoas, cuja economia tem crescido a um ritmo médio de 7% ao ano, um dos maiores do mundo. Como o elefante de Kipling, a Índia move-se num ritmo bastante próprio. Por um lado, mostra fôlego suficiente para despontar como uma das grandes potências do planeta. Ao lado da China, é uma das duas economias que mais cresce no mundo - com a vantagem de ser uma democracia. O ritmo de crescimento indiano tem se mantido entre 7% e 8% ao ano, as grandes empresas privadas do país começam a despontar como multinacionais, especialmente nos setores de alta tecnologia, software e farmacêutico. O país tem grandes reservas monetárias - US$ 133 bilhões, em fevereiro - e a agricultura cresce à média de 9,6% ao ano, enquanto o setor de manufatura deve crescer 8,9% este ano, ante 6,9% em 2004. Tal desempenho chegou a ser comparado à ascensão da Alemanha no século 19, em relatório produzido pelo Conselho Nacional de Inteligência dos Estados Unidos.

A outra face do crescimento indiano é que o país ainda tem uma pobreza que escandaliza até mesmo brasileiros, já acostumados com a própria miséria. Cerca de 25% da população vive abaixo do nível de pobreza, com menos de US$ 50 por mês. A Índia enfrenta sérios problemas de infra-estrutura. O fornecimento de energia é precário e a maior parte das estradas e portos remonta ao período colonial inglês, encerrado há quase 60 anos. "A situação é parecida com a do Brasil durante o milagre econômico na década de 70", compara Suvan Bery, diretor-geral do Conselho Nacional de Pesquisas Econômicas Aplicadas (NCAER, em inglês) e que foi economista-chefe para o Brasil no Banco Mundial. "Ainda há muita coisa a ser feita", diz.

Tome-se o exemplo de Mumbai, antiga Bombaim, capital econômica da Índia, com 15 milhões de habitantes. A cidade é sede de empresas como Reliance e Tata que, juntas, respondem por quase 7% do Produto Interno Bruto (PIB) indiano. Sua Bolsa de Valores tem mais de 6 mil empresas listadas (a de São Paulo tem 400).

Mas a primeira impressão que se tem da cidade é dramática. Assim que desce do avião, o visitante é recebido por um cheiro nauseante de esgoto e a visão da maior favela de toda a Ásia, a Dharavi, que cerca as pistas do aeroporto. A combinação de mau cheiro e miséria ostensiva volta a se repetir em vários outros pontos da cidade, como no bairro nobre de Colaba.

A prefeitura de Mumbai fez as contas e estima que serão necessários US$ 8 bilhões nos próximos 4 anos para remover barracos e renovar a infra-estrutura da cidade. Até agora, as iniciativas de remoção de favelas encontra resistências de políticos populistas que fazem delas seus redutos eleitorais. É uma situação muito diferente da que passou Xangai, quando a cidade foi praticamente arrasada e construída do zero pela ditadura comunista da China.

"As grandes cidades indianas como Délhi, Mumbai e Calcutá estão se tornando inviáveis. É melhor construir cidades-satélites totalmente novas", diz Tarun Das, presidente da ACC, maior empresa de cimento da Índia, e um dos fundadores da Confederação da Indústria Indiana (CII). "Vivi em Délhi por 30 anos e acabo de me mudar para Gurgaon", diz o executivo. Gurgaon, junto à capital indiana, mas já parte do Estado vizinho de Haryana, concentra empresas de alta tecnologia, edifícios de escritórios, condomínios e shopping centers.

O mesmo raciocínio se aplica aos portos. Os antigos terminais de Mumbai, Chennai e Calcutá estão sendo trocados por outros novos, construídos por empresas da Austrália e de Cingapura. No setor rodoviário, empreiteiras da Malásia já exploraram a construção de estradas em parceira com empresas indianas. "O problema é que a área de infra-estrutura esbarra em dois grandes problemas indianos: a regulamentação intrincada e corrupção", diz Rakesh Vaidyanathan, consultor baseado em São Paulo e especialista em investimentos na Índia. É mais um sinal de que as reformas ainda têm muito o que avançar.

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Deuses são perigosa arma política, no caldeirão religioso da Índia.

Nacionalistas hindus usam divindades em campanha para fomentar polêmica e atacar governo central do país.


BOMBAIM. Em nome de Rama ¿ um dos deuses do panteão hindu ¿ os políticos indianos se envolveram numa virulenta guerra verbal. Contrários à influência ocidental ¿ cada vez maior na Índia globalizada do século XXI ¿ os nacionalistas hindus tentam usar seus deuses como arma política. Uma receita perigosa, num país onde convivem lado a lado povos com religiões, línguas, dialetos, culturas e etnias muito distintas.

Nas últimas semanas os indianos têm acompanhado o bate-boca em torno da existência histórica de Rama ¿ protagonista do maior épico da mitologia indiana, o Ramaiana. Em meados de setembro, a oposição nacionalista hindu entrou na Justiça para tentar impedir a construção de um canal no meio de uma ponte natural que liga a Índia ao Sri Lanka . A oposição se opõe ao projeto afirmando que a ponte é sagrada, e que, segundo a tradição religiosa, foi construída há milhares de anos por Rama ¿com a ajuda de um exército de macacos¿.

Versão hindu de fatwa contra ateu

Para rebater os opositores, o Instituto de Arqueologia da Índia enviou um laudo taxativo à Suprema Corte: a ponte é obra da natureza e Rama é um personagem mitológico, cuja existência não é comprovada por qualquer evidência histórica.

Os nacionalistas hindus, então, acenderam uma fogueira religiosa para tentar chamuscar a imagem do governo parlamentarista de centro-esquerda, liderado pelo Partido do Congresso. Seu slogan: ¿Se você não acredita em Rama você não é ninguém¿. O governo ficou acuado e a ministra da Cultura, Ambika Soni, chegou a colocar seu cargo à disposição. Protestos de rua pipocaram pelo país, deixando dois mortos e vários feridos.

E os nacionalistas hindus prometem intensificar sua campanha contra a construção do canal e contra o governo até novembro, quando o país comemora o Diwal, um festival religioso que homenageia a volta de Rama à sua casa apos 14 anos de exílio.

Notório ateu, Muthuvel Karunanidhi, chefe de governo de Tamil Nadu, estado do Sul, onde fica a ponte, não mediu palavras contra os hindus radicais:

¿ Quem é esse Rama? Em que faculdade de engenharia ele se formou? Quando ele construiu a ponte? ¿ ironizou ele, que chegou a chamar o deus hindu de ¿bêbado¿.

Além de suscetibilidades religiosas, há outros ingredientes apimentados na batalha, como diferenças regionais e brigas entre castas. Em Tamil Nadu a figura de Rama é vista como emblema de uma tentativa de dominação por parte de indianos de castas altas do norte. Ram Vilas Vedanti, líder do grupo radical hindu Sangh Parivar, chegou a emitir uma versão hindu da fatwa (decreto religioso islâmico), prometendo recompensa em ouro pela cabeça e pela língua do ateu Karunanidhi.

¿Eles tentam transformar o mito de Rama em personagem histórico para satisfazer suas ambições políticas e provocar novos conflitos¿, atacou um dos maiores historiadores do país, o ex-reitor da Universidade de Sânscrito Sree Sankaracharya, K. N. Panikkar, em artigo publicado na revista ¿Frontline¿.

Nem o líder pacifista Mahatma Gandhi escapou da guerra santa em torno de Rama. As últimas palavras de Gandhi ao ser atingido por tiros disparados por um radical hindu, em 1948, foram: ¿Ram, Ram¿.

¿ Alguém do Partido do Congresso tem a coragem de dizer que a devoção de Gandhi a Rama era uma ilusão? Não vamos permitir que ninguém levante dúvidas sobre a existência de Ram ¿ esbravejou Rajnath Singh, presidente do BJP (partido nacionalista hindu).

Os seguidores de Gandhi reagiram.

¿ Nenhum partido político pode seqüestrar a herança de Gandhi. Não podem tentar usá-lo nessa guerra política ¿ protestou Amrut Modi.

O deus Rama já havia sido pretexto para uma guerra santa que provocou mais de mil mortes. Em 1992, nacionalistas hindus atiçaram revolta contra os muçulmanos (a segunda religião do país, com cerca de 120 milhões de adeptos): destruíram a mesquita Babri na cidade de Ayodhya, afirmando que aquele era o local de nascimento de Rama. Hoje, os próprios religiosos de Ayodhya rejeitam o uso político de Rama: ¿Os extremistas querem apenas usar a polêmica da Ponte de Rama como ponte para alcançar o poder e ganhar dinheiro¿, disse ao jornal ¿The Indian Express¿ Gyan Das, responsável pelo templo hindu Hanuman Garhi, vizinho à mesquita destruída em Ayodhya.

Krishna também é usado para criar polêmica

Os radicais ainda tentam repetir conflitos como o de Ayodhya.

¿ O eleitor indiano de hoje, integrado à globalização, não vota apenas por emoção ou ideologia. Ele quer ouvir propostas que tragam oportunidade e inclusão ¿ analisou Sagarika Ghose, editora da Rede de TV indiana CNN-IBN. ¿ Vemos hoje a conversão do hinduísmo em produto de marketing, tornando-o mais simples e compreensível para o povo. O hinduísmo é uma religião menos centralizada do que as outras. Não tem um único deus, não tem líder que dita as regras. Por isso os radicais procuram provocar uma nova tragédia como Ayodhya, agora através da polêmica sobre a ponte Ram ¿ explicou o especialista Santosh Desai.

O fôlego dos extremistas é inesgotável. Eles não se contentam em politizar apenas o deus Rama. Krishna, outro deus do panteão hindu, não escapou das garras dos radicais. O gatilho foi um panfleto de propaganda distribuído pelo Ministério da Cultura, no qual está impresso uma tradicional pintura: Krishna em cima de uma árvore, cercado por mulheres nuas que imploram para que ele devolva suas roupas. E a frase: ¿Você vai precisar apenas de uma coisa para viajar de volta a cinco mil anos, um confortável par de sapatos¿.

O rosto do faraó menino.

A partir de exames feitos na múmia de Tutankamon, peritos constroem três modelos parecidos de sua cabeça

CAIRO. Cientistas franceses, egípcios e americanos conseguiram reconstituir a cabeça e o rosto do rei egípcio Tutankamon. A novidade foi divulgada ontem pelo Conselho Supremo de Antigüidades do Egito, que afirmou ter conseguido resultados provavelmente muito próximos do que teria sido a verdadeira aparência do faraó, morto precocemente numa idade estimada entre 17 e 19 anos.

Pesquisadores construíram três modelos parecidos

O motivo que faz o conselho acreditar na precisão dos resultados está na semelhança obtida em três diferentes trabalhos. Os pesquisadores, divididos em grupos, produziram separadamente três modelos do que seria a cabeça do rei e as semelhanças, segundo Zahi Hawass, secretário do conselho, são impressionantes.

- Os três modelos são muito parecidos e nitidamente vemos que mostram a mesma pessoa. Os olhos, boca e aspectos do crânio são muito semelhantes. As únicas divergências são em relação às orelhas e ao nariz - explica ele.

Os peritos submeteram a múmia do rei, de 3.300 anos, a exames de ressonância magnética para mapear seu crânio. Foram feitas 1.700 imagens durante os 15 minutos de duração do exame.

Os três grupos utilizaram a mesma técnica. Construíram uma base de plástico da cabeça - a partir das coordenadas fornecidas pelo exame - que foi moldada com a ajuda de escultores e arqueólogos. Sobre o modelo, foram aplicadas camadas de silicone e de tinta, para dar volume e cor a olhos, pele, boca e cabelo, de acordo com antigas estátuas que retratavam o faraó.

A reconstituição foi anunciada dois meses depois de o ministro da Cultura do Egito, Faruq Hosni, anunciar que pesquisas recentes indicam que Tutankamon não teria sido assassinado. A partir de radiografias feitas em janeiro, um grupo formado por pesquisadores de diversos países chegou à conclusão de que a cabeça e a nuca do rei não tinham indícios de terem sido feridas. Até então, a tese mais provável era de que o jovem havia sofrido um golpe mortal na nuca.

A múmia foi descoberta em 1922 pelo arqueólogo britânico Howard Carter. Tutankamon reinou por apenas dez anos, de 1333 a.C. a 1323 a.C.

Legenda da foto: UM DOS modelos da cabeça do faraó apresentados pelos pesquisadores

Obras revitalizam museu nacional.

Bons ventos começam a soprar no Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista. Salas que estavam fechadas há 12 anos, como a dos peixes, aves e répteis, acabam de entrar em obras para ser reabertas. A fachada que dá para o pátio interno da mais antiga instituição científica do país, antes caindo aos pedaços, foi reformada. Os funcionários, que tinham até medo de passar por ali, agora aproveitam a beleza dos jardins para descansar e ler.


E, graças a parcerias com a iniciativa privada e a recursos do governo federal, começam no dia 2 de maio as obras do primeiro dos quatro prédios que serão construídos no Horto Botânico do museu, a poucos metros do antigo palácio que pertenceu à família imperial.


Com isso, a instituição dá os primeiros passos para transformar um sonho em realidade: ser um dos maiores museus de história natural do mundo. Acervo para isso existe. Vão faltar os recursos, estimados em R$40 milhões, que ainda estão sendo captados pela direção. A construção dos prédios vai permitir que os 12 mil metros quadrados sejam exclusivos para exposição.


Rosa da fachada dará lugar ao amarelo original


Os edifícios, com três andares cada, vão abrigar toda a parte técnica e científica, além de uma das maiores coleções de ciências naturais e antropologia da América Latina. Depois dessa transferência, o palácio, criado por Dom João VI no dia 6 de junho de 1818, pode entrar em reforma para recuperar toda a sua majestade. Na fachada, o rosa forte vai dar lugar à cor original do império: amarelo.


Depois da crise de maio do ano passado, quando foi descoberto o roubo de in-fólios raros (tipo de livro com até 60 centímetros de altura) e havia o risco iminente de incêndio, o museu agora respira novos ares.


¿ Apesar de o visitante ainda não perceber, o museu está indo muito bem. Estamos organizando as coleções, os equipamentos de segurança já chegaram e serão instalados. Teremos o primeiro prédio pronto ainda este ano e vamos transferir toda o setor de botânica para lá ¿ comemora o diretor do museu, Sérgio Alex Azevedo.


O primeiro prédio, cuja entrega está prevista para outubro, vai ser patrocinado pela Petrobras e pela Fundação Souza Cruz. Para o conjunto de edifícios, são necessários R$15 milhões.


Já no prédio do museu a última reforma aconteceu há mais de 50 anos. O diretor vai aproveitar a reunião com o Ministério da Cultura, em maio, para tratar de verbas.


¿ Fico muito feliz só de ver que essa fachada interna devolveu a auto-estima aos funcionários e que estamos indo para frente ¿ disse o diretor.


Em obras há cerca de quatro anos, os telhados estão praticamente prontos, faltando apenas os da chamada torre sul do complexo histórico. A sala que abrigava o acervo de antropologia está toda quebrada, as peças recebendo limpeza e tratamento especial para voltar para um ambiente, depois da reforma, mais adequado.


¿ Da área do museu, temos apenas cerca de 30% em exposição ¿ disse o diretor administrativo do museu, Wagner Willian Martins.


Para ele, o museu poderá ter uma posição inédita no cenário internacional. Com cerca de 20 milhões de peças, mesmo com as reformas ainda vai faltar espaço para colocá-las em exposição:


¿ Nossa projeção indica que, dos 300 mil visitantes por ano, poderemos pular para um a dois milhões por ano. Não vamos fazer feio: teremos o nosso museu entre os mais importantes do mundo ¿ disse.

sábado, 4 de julho de 2009

Índios e a população.

A reserva de grandes áreas para usufruto exclusivo de índios em zonas de fronteira gera duas preocupações. De um lado, potencializa a vulnerabilidade da soberania nacional, de vez que abre caminho para que as tribos isoladas sejam usadas como massa de manobra por ONGs e organismos estrangeiros interessados em internacionalizar, se não toda, larga parte da faixa fronteiriça da Amazônia brasileira. De outro, se é imperativo respeitar os direitos históricos dos índios, o poder público tem tratado o problema de forma particularista, com viés étnico e abordagem unilateral, capazes de reintroduzir na sociedade uma intolerância aos índios que não interessa à unidade da nação.

É inquietante que muitos brasileiros de boa-fé, partidários da causa indígena, demonstrem irritação com episódios como a demarcação de 9,6 milhões de hectares (a área do Líbano) para os ianomâmis, no Amazonas e em Roraima, e, agora, mais 1,7 milhão de hectares na reserva de Raposa Serra do Sol, para cinco tribos de Roraima.

Se seguirmos o modelo histórico de ocupação do território, baseado em nossa formação étnica tripartite, veremos que o respeito às prerrogativas dos índios não pode implicar desproteção de regiões tão cobiçadas como a Amazônia, impedindo-se, como agora se impede, a vivificação das zonas de fronteira que tradicionalmente se faz pela presença não só do Estado como sobretudo de empreendedores não índios, a exemplo dos agricultores de Roraima, que ocupam a terra e a fazem produzir riquezas em benefício de todos.

Fronteiras ricas e ermas aguçam a ambição alheia. Foi com uma ocupação precária que consolidamos o território deste país continental, inclusive anexando a maior parte da Amazônia que, pelo Tratado de Tordesilhas, pertencia à Espanha.

Urge tratarmos o assunto com a sabedoria necessária para não estigmatizar os índios como vilões, tampouco apequená-los como vítimas que uma certa Historiografia e Antropologia jogam num vale de lágrimas da História do Brasil. Nosso caldeirão cultural incorpora em vez de segregar. O destino de todos, dos índios ao mais recente imigrante, é se integrarem na sociedade nacional. A esse ideal dedicou-se o Humanismo de nossas inteligências mais poderosas, de José Bonifácio a Darci Ribeiro, do Marechal Rondon aos Irmãos Vilas Boas.

Como reconheceram os intérpretes mais certeiros, a começar por Gilberto Freire, os índios figuram entre os construtores do Brasil. De seu seio saíram homens de Estado, como Arariboia, parceiro de Estácio de Sá na expulsão dos franceses e consolidação do Rio de Janeiro, no século XVI, e Poti, ou Antônio Filipe Camarão, herói da guerra aos holandeses no século XVII ¿ ambos agraciados com o título de Dom e capitãomor pela Coroa portuguesa. Mesmo os guerreiros que se opuseram à colonização lusa, como os tuxauas tamoios, Cunhambebe, aliado dos franceses, e o manao Ajuricaba, são heróis do eclético panteão nacional: lutaram com bravura, e ao menos Ajuricaba, ao preferir o suicídio à prisão, constelou na morte o lema de José Bonifácio de que ¿a liberdade é um bem que não se pode perder senão com o sangue¿.

Séculos depois desses episódios, a nação é uma só. Não podemos correr o risco de abrigar um Estado multinacional e uma nação balcanizada. Ao contrário: conjugando isonomia e respeito às diferenças, podemos comemorar o saldo amalgamado de índios, brancos e negros que forjaram o povo brasileiro.

Cada tentativa de conferir superioridade de qualquer tipo a um deles deve ser repudiada. Nesse conflito, não ocorre o dilema de escolher entre irmãos o que será ungido e o que será imolado, pois as soluções devem atender e beneficiar todos e sobretudo ao interesse geral de um país forte, justo e democrático no engrandecimento de sua população.

Mitos a respeito da Amazônia.

Repetidos com freqüência, ganham colorido de verdade. Francisco Orellana, descendo o Rio Maranon em 1541 à procura do soberano que se cobria de ouro, dito "El Dorado" - daí Eldorado -, teria enfrentado mulheres guerreiras, denominadas "amazonas" na mitologia grega. Diz a lenda que um cacique confirmara a existência dessas valentonas brancas que moravam "solteiras" em uma cidade de pedra e que só aceitavam homens quando lhes aprazia. A história das amazonas deu nome ao rio caudaloso até então conhecido por Mar Doce ou Rio Grande. Assim, o nome da Amazônia tem origem na mitologia, o que pode explicar vários dos mitos que, repetidos com freqüência, vão adquirindo colorido de verdade. As notícias sobre artigo no Economist e sobre a III Conferência Científica do LBA (1.500 participantes, patrocínio do MCT) informam que a floresta é sorvedouro de carbono, contribuindo para amenizar o efeito estufa sobre o planeta. Ora, todos sabem que a floresta acha-se em equilíbrio, dito clímax, quando o gás carbônico absorvido pela fotossíntese corresponde ao desprendido pela decomposição da serapilheira. As árvores cresceriam continuamente se não soltassem galhos e folhas, os quais se acumulariam ano após ano, se não se decompusessem. Esse estado de equilíbrio resulta na troca balanceada de oxigênio e de gás carbônico com a atmosfera. Não temos o "pulmão do mundo". São confusas, igualmente, as assertivas míticas sobre queimadas. A floresta alta não se incendeia a menos que cortada. Somente os campos e cerrados, forrados de gramíneas, pegam fogo por descuido ou propósito do homem ou em decorrência de faísca elétrica. O fogo periódico faz parte do clímax do cerrado, vindo a vegetação subseqüente reabsorver gás carbônico desprendido. Os aerossóis da fumaça de origem vegetal são refletores da radiação solar, atenuando o aquecimento. Por outro lado, boa parte do gás carbônico das queimadas é reabsorvida pela vegetação subseqüente - pasto, lavoura ou capoeira - e pelo aumento do húmus resultante do plantio direto. O impacto sobre o efeito estufa é muito menor do que se apregoa. Os ecologistas que vão para o mato conhecem tudo que descrevemos e muito mais. Os urbanizados deveriam conhecer a realidade do sertão, poupando os interessados, menos informados, de cansativas e monótonas histórias do fim do mundo. A expansão da agropecuária é uma realidade notável, graças à iniciativa e à capacidade de empreender e trabalhar de nossos patrícios. Eles estão captando a energia solar que não atravessa as copas arbóreas. Estão capitalizando nosso clima de verão chuvoso. Estão tornando a terra mais fértil, mantendo as águas limpas e o ar livre de poeira, graças a uma agricultura conservacionista e sustentável. O exemplo de Sorriso (MT) e arredores não é um mito.